João
Cassiano (360-430)
Serenus: "A autoridade
da Sagrada Escritura tem dito algumas coisas tão lucidamente e claramente para nossa instrução, que mesmo para
aqueles de inteligência limitada, não estão encobertas pela obscuridade de um
significado oculto, mas elas nem sequer
precisam ser explicadas, e oferecem inteligibilidade e significado à
primeira vista. (ACW, Vol. 57, Boniface Ramsey, O.P., trans., John
Cassian: The Conferences, Eighth
Conference, Chapter 3.1 (New York: Newman Press, 1997), p. 292)
Cassiano
cita Serenus, um abade a quem admirava. Há coisas tão claras que nem precisam
ser explicadas mesmo para pessoas de pouca inteligência.
Este homem, portanto, quando
alguns dos irmãos estavam pensando na luz esplêndida de seu conhecimento e
foram pedindo-lhe alguns significados da Escritura, disse que um monge que queria adquirir conhecimento das Escrituras não
deveria gastar seu tempo com as obras dos comentadores, mas sim manter
todos os esforços de sua mente e intenções de seu coração fixo em purificar-se
de vícios carnais; pois, quando estes são expulsos de uma só vez dos olhos do
coração, como se o véu das paixões fosse removido, começará naturalmente a contemplar os mistérios da Escritura: já que
não foram declarados para nós, pela graça do Espírito Santo, a fim de que
permanecessem desconhecidos e obscuros; mas são tornados obscuros por nossa
culpa, quando o véu de nossos pecados cobre os olhos do coração, mas quando estes são restaurados ao seu
estado natural de saúde, a simples leitura da Sagrada Escritura é, por si só,
amplamente suficiente para contemplar o
verdadeiro conhecimento, e nem é necessária a ajuda de comentaristas, assim
como esses olhos carnais não precisam de um homem para ensinar a ver, desde que
eles estejam livres da obscuridade ou da escuridão da cegueira. Por esta razão,
têm surgido grandes diferenças e erros entre os comentaristas porque a maioria
deles, não prestando nenhum tipo de atenção em purificar a mente, apressa-se
para o trabalho de interpretar as Escrituras, e em proporção à densidade ou
impureza de seus corações formam opiniões que estão em desacordo entre si e
contrárias a fé, e por isso são incapazes de tomar a luz da verdade. (NPNF2:
Vol. 11, On the Incarnation of
Christ Against Nestorius, Book 7, Chapter 17)
Papistas
repetem a exaustão o argumento de que se a Escritura fosse formalmente
suficiente, não teríamos tantas interpretações diferentes e tantos distorcendo
seu significado. O erro fatal deste argumento é pressupor que a qualidade de
uma interpretação dependa apenas do texto interpretado sem levar em conta as
características do intérprete. Como expôs Cassiano, o pecado impede que o homem
perceba o significado da Palavra de Deus. A Palavra escrita de Deus não é
obscura em sua natureza, nós que a tornamos assim por causa do pecado. Em sua
natureza, ela é tão clara que dispensa ajuda de comentaristas.
E de fato vamos provar isso
não só por discussão e argumentação, mas pela voz da própria Divindade: pois
nada presta melhor testemunho de Deus do que as coisas divinas. E porque nada
se conhece a si mesmo melhor do que a própria glória de Deus, não acreditamos em nada sobre o assunto de
Deus com certeza maior do que aqueles escritos em que o próprio Deus é o seu
próprio testemunho. (NPNF2: Vol. 11, On the Incarnation of Christ Against Nestorius, Book 7, Chapter
17)
Cassiano
defende a supremacia das Escrituras. Não há nada mais certo a quem podemos
recorrer sobre Deus do que as Escrituras. Ele também diz que Deus é sua própria
testemunha nas Escrituras e que basta usar essa voz, sem a necessidade de
discussão e argumentação, o que implica que esta voz deve ser clara e
compreensível. Dizer que a Escritura é obscura é ofender a própria voz de Deus
e seu propósito de usá-la para guiar o ser humano.
Isidoro
de Pelúsio (? – 436)
Se Deus tivesse que
respeitar apenas a sua própria dignidade, e não o proveito do leitor, Ele teria
usado palavras celestiais e divinas e exemplos. Mas desde que ia legislar para os homens que são fracos e precisam de
palavras humanas (porque assim eles seriam capazes de entender facilmente as
coisas acima deles), Ele expressou
suas doutrinas divinas em palavras, com a intenção de que mesmo uma mulher, uma
criança e os mais ignorantes de todos os homens pudessem obter algum benefício,
mesmo através da audição. Pois, a palavra tem consideração pela salvação da
multidão. Até mesmo a camponeses é
expressa com tanta clareza através da caridade do legislador, para não privar
ninguém do benefício proporcionado pelos seus poderes. Nem tem
negligenciado o mais sábio da humanidade. Por
isto tão grande clareza habita nestas palavras inefáveis como tesouros, que
mesmo o mais sábio e mais instruído dos homens está perdido na profundidade dos
pensamentos, e muitas vezes confessa-se superado pela incompreensibilidade da
sabedoria. (Epistolarium,
Liber II, Epistola 5, PG 78:461-464; for translation, see William Goode, The Divine Rule of Faith and Practice,
2nd ed., 3 Vols. (London:
John Henry Jackson, 1853), Vol. 3, p. 284.)
Isidoro
repercute o pensamento patrístico de que Deus escreveu sua palavra de forma
clara e simples para que todos os homens pudessem compreendê-la. Até mesmo os
mais ignorantes poderiam entender a mensagem e ganhar a salvação – objetivo da
Escritura divina.
Se todas as coisas fossem
simples, onde deveríamos fazer uso de nossa compreensão, não havendo qualquer
investigação para fazer? Mas se todas as coisas fossem obscuras, assim também
falharíamos, não havendo descoberta da verdade. Mas agora, por aquelas partes que são simples, as que são obscuras são
desta maneira compreendidas. (Ibid., p.
285)
É
o princípio de que partes simples esclarecem partes obscuras. Interessante
notar a argumentação de Isidoro para explicar por que nem tudo é simples. Se
tudo fosse simples, não haveria investigação alguma, mas como é do interesse de
Deus que seus filhos leiam e estudem as Escrituras, nem tudo deve ser simples.
O princípio da Suficiência Formal não excluir a necessidade dos cristãos
estudarem com esmero as Sagradas Letras.
Se a verdade está unida a
linguagem eloquente, é capaz de beneficiar o educado, mas a todos os outros,
será de nenhuma utilidade ou vantagem. Por
isto a Escritura declara a verdade em linguagem simples, que tanto os
ignorantes e os sábios, e até mesmo as crianças e as mulheres podem aprendê-la.
Pois por isto, o sábio não é ofendido; mas da outra forma [Escritura sendo
escrita em linguagem superior] a maior parte do mundo teria sido ferida; e se
convinha que se considerasse a alguns, mais especialmente convinha que se
considerasse a muitos; e uma vez que considerou todos, é claramente demonstrado
que é divino e celeste. (Ibid., p. 284)
Os
Pais da Igreja lidavam frequentemente com a acusação pagã de que a linguagem da
Escritura era simplória e pouco douta. Como eles respondiam a isso? Diziam “não
é verdade, a Bíblia tem linguagem difícil e complexa, por isto, temos um magistério
infalível exercido pelo bispo de Roma que nos traz o significado correto”. Não
mesmo, eles invertiam o argumento, é justamente por ser tão simples e
compreensível a todos, que se demonstra sua origem divina.
Os oráculos sagrados e
celestes, desde que eles foram ditos e escritos para o benefício de toda a
humanidade, foram expressos em linguagem
simples. . . . Todos aqueles que estão envolvidos na agricultura, nas artes
e outras ocupações da vida, obtêm
benefício com sua clareza; aprendendo tanto o que é correto, o que é justo
e o que é útil num momento do tempo.
(Ibid.,p. 285)
Cirilo
de Alexandria (375 – 444)
Por
loucura da pregação ele quer dizer a clareza da fraseologia da Escritura
inspirada
(...) ouça-me um pouco, e veja o que é bom saber, através das proclamações
evangélicas, no qual, diz ele, sua alma seria abundantemente alegrada e
nutrida. Há o verdadeiro conhecimento de
Deus sobre como ele é, e instruções quanto a toda a virtude e correção de
conduta, tornando-nos santos; e sabedoria com maravilhosa exatidão e correto
discernimento sobre tudo que deve ser feito, e perfeitamente dispõe a mente
para a prática de boas obras. (Commentarium
in Isaiam prophetam, Liber V, Tomus II, PG 70:1221; translation by William
Goode, The Divine Rule of Faith and Practice, 2nd ed., 3 Vols. (London: John Henry Jackson, 1853), Vol.
3, p. 181-182)
Cirilo,
ao comentar 1 Coríntios 1:21, afirma a clareza da Escritura no primeiro
negrito. No segundo, afirma a suficiência material ao dizer que nela há
sabedoria sobre tudo o que deve ser feito.
Portanto, a Escritura
inspirada é perfeitamente suficiente,
de modo que aqueles que foram alimentados tornam-se sábios e muito prudentes, e possuidores de uma compreensão plenamente
instruída em todas as coisas. ... O
que é proveitoso para nós e não é falado por ela? Pois, em primeiro lugar
(o que também é mais excelente do que todas as outras coisas), qualquer um pode ver nela a gloriosa
doutrina do verdadeiro conhecimento de Deus. ... Além disso, nos ensina
como direcionar corretamente nossa vida e conversa, e pelas suas leis divinas e
sagradas nos orienta no caminho da justiça, e faz o caminho de toda justiça claro para nós. (Contra Julianum, Liber VII, PG 76:852-853;
translation by William Goode, The
Divine Rule of Faith and Practice, 2nd ed., 3 Vols. (London: John Henry Jackson, 1853), Vol.
3, pp. 282-283)
Mais
uma vez suficiência material e formal defendidas. Cirilo diz “perfeitamente
suficiente” porque as Sagradas Letras nos instruem em todas as coisas de forma
clara. Por isso, qualquer um pode ver nela a gloriosa doutrina do verdadeiro
conhecimento de Deus.
Mas alguém dirá que a
escritura divina tem um estilo e expressão comum a todos, vulgar e banal,
considerando que as coisas dos gregos são expressas elegantemente e abundam em
graça e eloquência. Dizemos, portanto, que os livros proféticos e mosaicos são
expressos na língua hebraica e para que
eles possam ser do conhecimento de todos, pequenos e grandes, são utilmente
comprometidos com uma expressão familiar, de modo a não ficar além da
capacidade humana. (Contra
Julianum, Liber VII, PG 76:853; for translation, see William
Whitaker, A Disputation on Holy Scripture Against the Papists,
Especially Bellarmine and Stapleton, trans. and ed. William
Fitzgerald (Cambridge: University Press, reprinted 1849), p. 399)
Até
os pagãos consideravam a linguagem da Escritura simples, em contraposição aos
gregos que escreviam com elegância e eloquência. Cirilo responde que a
simplicidade faz parte do propósito de Deus, de forma que o conhecimento esteja
ao alcance de todos.
Para essas pessoas, o
divinamente inspirado Paulo também escreve nestas palavras: "Uma vez que
você eram trevas, mas agora no Senhor você são luz"; e em outros lugares
também: "Somos todos filhos da luz e filhos do dia, não da noite ou
escuridão"; a mente dos crentes é
iluminada pelos oráculos do Evangelho. Consequentemente, o David
divinamente inspirado também diz como que para o Senhor Jesus Cristo "Sua
Lei é lâmpada para os meus pés e luz para os meus caminhos." Em outras
palavras, a Lei dada através do todo-sábio Moisés era, por assim dizer
obscurecida (...) mas pela pregação do
Evangelho a beleza da realidade é apresentada nua e resplandecente, e
alegra o espírito com a compreensão de pessoas piedosas como a infusão de uma
luz. (Robert Charles Hill (translator), Cyril of Alexandria: Commentary on Isaiah,
Volume 2 (Brookline, Massachusetts: Holy Cross Orthodox Press,
2008) pp. 135-36)
O
Evangelho ilumina a mente dos crentes de forma imediata. Essa iluminação não
depende de uma instituição, a simples mensagem do evangelho é suficiente por si
mesma para iluminar a mente do pecador. Cirilo reverbera uma importante função
do Evangelho – lançar luz sobre o significado do antigo testamento. Os apóstolos
entendiam que o evangelho já havia sido pregado pelos profetas, portanto, a
pregação apostólica era basicamente uma exposição clara do evangelho que estava
contido na antiga aliança.
Teodoreto
de Ciro (393-466)
A Escritura divina está
acostumada a acomodar suas lições
àqueles que estão sendo instruídos; e para o perfeito, oferece o que é
perfeito; e para o ignorante, pontos
elementares e coisas adaptadas à sua capacidade. (Quæstiones in Genesim, Interrogatio I, PG
80:77; translation in William Goode, The Divine Rule of Faith and
Practice, 2nd edition, 3 Volumes (London: John Henry Jackson, publisher,
1853), Vol. 3, p. 285)
A Escritura divina adapta sua língua aos homens; e ordena suas
palavras, de modo que eles possam ser capazes de entender. (Ibid., p. 285)
Esses tolos não conseguem
entender que o Senhor Deus, quando fala
aos seres humanos através do homem ajusta sua linguagem às limitações dos
ouvintes. (Quæstiones in Genesim,
Interrogatio XX, PG 80:104C; Robert C. Hill, trans., Theodoret of
Cyrus: The Questions on the Octateuch, Volume 1, Questions on Genesis,
Question 20 (Washington: The Catholic University of America Press, 2007) p. 51)
Algumas pessoas que têm
caído na desgraça desta acusação, e têm se esforçado para rebaixar o valor da
Divina Escritura, e especialmente os oráculos inspirados, de sendo envolto em obscuridade. Para essas pessoas, o divinamente
inspirado Paulo responderia: "Agora, mesmo se o nosso evangelho está
encoberto, é velado para os que estão perecendo, mas para os maduros é a
sabedoria que estamos falando." De acordo com isto, também é dito por
nosso Senhor e salvador para os Santos Apóstolos "a vós é dado conhecer os
mistérios do reino, que, para aqueles outros não é dado;" e para explicar
a razão, ele imediatamente acrescenta: "Vendo eles não enxergam e ouvindo
não entendem" - ou seja, eles
voluntariamente trazem sobre si mesmos a nuvem da ignorância: se eles se
voltarem para o Senhor, como diz o Apóstolo, o véu será levantado. Realidades
divinas, portanto, não são obscuras para todos, mas apenas para aqueles que são
voluntariamente cegos. Eles deveriam tomar nota e perceber que nada que
vale a pena é prontamente acessível aos seres humanos. (In Ezechielem - Præfatio, PG 81:808-809;
Robert Charles Hill, trans., Theodoret of Cyrus, Commentaries on the
Prophets, Vol. Two, Commentary on the Prophet Ezekiel (Brookline: Holy
Cross Orthodox Press, 2006), preface, pp. 27-28)
Nas
citações acima, Teodoreto repete as ideias já vistas em outros pais: a
Escritura é simples e clara porque pretende ser compreensível aos leitores e a
obscuridade da Palavra Escrita para alguns nasce do pecado humano e não da
natureza da própria palavra.
Que ninguém, especialmente
os devotos da religião verdadeira, adote
a atitude tão presunçosa ao Espírito divino de acusar as suas palavras de
obscuridade. Em vez disso, em seu desejo de entender as palavras sagradas,
deixe-os chorar em voz alta como o divinamente inspirado Davi: "Revele aos
meus olhos, e vou agarrar as maravilhas de vossa lei" - tendo prometido o conhecimento como um
benefício, ele definitivamente irá conceder o pedido. Na verdade, no nosso caso, também vamos oferecer este pedido ao Senhor,
que de acordo com o divino Davi dá sabedoria aos cegos, e de acordo com
abençoado Isaías [dá sabedoria] para aqueles em trevas e escuridão. (Ibid., p.
29)
Teodoreto
condena a atitude de atribuir obscuridade à Escritura. Afirma que devemos pedir
a Deus que ilumine nossas mentes.
Salviano
o Presbítero (Séc. V)
Na palavra, obras santas
deveriam ser feita por cristãos se Cristo tivesse ensinado coisas santas. Ele
que é adorado pode ser julgado por seus adoradores. Pois como é um bom professor cujos alunos
vemos que são tão maus? Deste ponto de vista, eles são cristãos, eles o ouvem e
o leem. É fácil para todos entender o
ensinamento de Cristo. (FC, Vol. 3, The Writings of Salvian, The Presbyter, The Governance of God,
Book 4, §17 (New York: CIMA Publishing Co., Inc., 1947), pp. 120-121)
Portanto “Deus se arrependeu",
diz a Sagrada Escritura, "de ter feito o homem na terra", o que não
indica que Deus está sujeito ao arrependimento ou qualquer outra emoção, mas
sim que a palavra divina, para promover
nossa compreensão do verdadeiro significado das Escrituras, nos fala em termos
de sentimento humano e mostra a força da ira de Deus sob o nome de
arrependimento; além disso, a ira divina é a punição do pecador. (Eva
M. Sanford, translator, Salvian:
On the Government of God, Book I, Chapter 7 (Columbia University Press,
1930) p. 53)
A
Escritura usa antropomorfismo para ser mais compreensível. Subentende-se que
para Salviano, o propósito de Deus é que suas palavras sejam compreensíveis.
Vocês que leem estas
palavras talvez estejam perturbados e condenem o que leram. Eu não retrocederei
por causa de sua censura; condenem-me se
eu não conseguir provar as minhas palavras, condenem-me se eu não mostrar que
as Sagradas Escrituras também tem dito o que afirmo agora. (Sancti
Salviani Massiliensis Presbyteri De
Gubernatione Dei, Liber Quartus, §13, PL 53:85B; translation in Eva M.
Sanford, translator, Salvian: On
the Government of God, Book IV, Chapter 13 (Columbia University Press,
1930) p. 121)
Não
há aqui uma declaração explícita sobre a perspicácia da Escritura, mas é a
consequência direta do raciocínio de Salviano. Ele julga ser capaz de
estabelecer apenas pelas Escrituras a verdade que afirma, o que não faria
sentido numa perspectiva papista.
A questão é levantada por
que, se tudo neste mundo é controlado pelo cuidado, governança e julgamento de
Deus, a condição dos bárbaros é muito melhor que a nossa, porque entre nós a
sorte de homens bons é mais difícil do que a de ímpios. Por que homens justos
adoecem e réprobos recuperam? Por que o mundo inteiro é vítima de poderes para
a maioria injustos? Talvez uma resposta racional e bastante coerente fosse:
"Eu não sei". Pois eu não sei os segredos de Deus. O oráculo da sua
palavra celeste é prova suficiente para mim neste caso. Deus diz, como já
provei em meus livros anteriores, que todas as coisas estão sujeitas à sua
supervisão, seu governo e seu julgamento. Se
você deseja saber que doutrinas deve aceitar, você tem os escritos sagrados: a
conduta perfeita é se manter firme neles.
Nós não temos a liberdade de
dizer que as ações da vontade divina são umas justas e outras injustas, porque
tudo o que vê é feito por Deus, tudo o que tem certeza é feito por ele, você
deve reconhecer somente isso. Muito mais pode ser dito do governo de Deus e
justiça sem uma discussão mais aprofundada e sem incertezas. Eu não preciso
provar com argumentos o que se provou por suas próprias palavras. Quando lemos
que Deus diz que constantemente vê toda a terra, temos a prova de que ele a vê,
já que ele diz isso. Quando lemos que ele governa toda a criação, temos provas
de que ele governa, porque ele assim afirma. Quando lemos que ele ordena que
todas as coisas por seu julgamento imediato, seu julgamento está claramente
provado por seu próprio testemunho. Todas
as outras declarações, feitas em termos humanos, precisam de provas e
testemunhas, mas a fala de Deus é o seu próprio testemunho, uma vez que as
palavras da verdade perfeita devem ser o perfeito testemunho da verdade. No
entanto, já que nosso Deus quis que soubéssemos certas coisas através da
Sagrada Escritura, como que a partir dos arquivos do seu espírito e mente ----
uma vez que os pronunciamentos das Sagradas Escrituras são eles próprios desta
maneira a mente de Deus. Não vou esconder nada do que Deus quis que seu
povo conhecesse e pregasse. (Sancti Salviani Massiliensis Presbyteri De Gubernatione Dei, Liber Tertius,
§1, PL 53:57B; translation in Eva M. Sanford, translator, Salvian: On the Government of God,
Book III, Chapter 1 (Columbia University Press, 1930) pp. 77-79)
Salviano
afirma a completa suficiência da Escritura, tanto formal como material. Todas
as doutrinas que devem ser aceitas estão nela. A Escritura não precisa de
provas ou testemunhas segundo o presbítero, ou seja, ele não endossaria o
argumento de alguns apologistas que a Bíblia sem a Igreja não tem autoridade.
Fulgêncio
de Ruspe (468-533)
Nos mandamentos, como nos
mais ricos mantimentos, a abundância espiritual das iguarias celestes é tão exuberante,
que há na palavra de Deus abundantemente
para o perfeito comer, e completamente também para o bebê sugar. Pois há
tanto o leite da amamentação, pelo qual a terna infância do crente pode ser
nutrida, como a comida sólida no qual a juventude robusta do perfeito pode ganhar
aumento espiritual de santo vigor. Esta provisão é feita universalmente para a
salvação de todos aqueles que o Senhor planeja salvar. Ouvimos os preceitos que
devem ser realizados: sabemos as recompensas que estamos esperando. Há o comando que ensina pela letra e nos
instrui para o conhecimento: há a promessa que nos atrai pela graça e nos
leva à glória. (Sermo Primus,
PL 65:721; translation in William Whitaker, A Disputation on Holy Scripture Against the Papists, Especially Bellarmine
and Stapleton, trans. and ed. William
Fitzgerald (Cambridge: The University Press, reprinted 1849), p. 400)
Fulgêncio
afirma a suficiência material ao dizer que nos instrui abundantemente e
completamente. Há também suficiência formal quando diz que o comando, se
referindo à Escritura, nos ensina e instrui. Ou seja, a palavra escrita de Deus
tem função magisterial nos ensinando por si mesma.
Leão
I (400-461)
Mas se ele não puder extrair
um entendimento legítimo (da matéria) a partir desta pura fonte da fé cristã, porque ele tinha escurecido o brilho da
verdade clara por um véu de cegueira peculiar a si mesmo, poderia ter se
submetido ao ensino dos Evangelhos. E quando Mateus fala do "livro da
geração de Jesus Cristo, o Filho de David, filho de Abraão [Mateus 1: 1]",
ele poderia ter também procurado a instrução oferecida pelas declarações dos
Apóstolos. E lendo na Epístola aos Romanos, "Paulo, servo de Jesus Cristo,
chamado apóstolo, separado para o evangelho de Deus, que Ele antes havia
prometido pelos seus profetas nas Sagradas Escrituras sobre seu filho, que foi
feito para Ele da descendência de David segundo a carne [Romanos 1:1-3]. (Leo
I of Rome (aka Leo the Great), Letter
28 ("The Tome"), Section 1)
Leão,
bispo de Roma, estava atacando os erros de Nestório. Nessa carta, ele já havia
citado o credo apostólico, o que ele chama de “pura fonte da fé cristã”. O
credo é basicamente o resumo de doutrinas fundamentais da Bíblia. Após, ele
passa a citar diversas passagens bíblicas que eu não trouxe integralmente para
não deixar a citação muito grande. O ponto é que Leão entende que a heresia em
questão era claramente resolvida pela Escritura, o que implica que pelo menos
nesse ponto ela seria clara. Apologistas católicos costumam apontar a doutrina
cristológica como um exemplo de matéria obscura na Bíblia. Parece que Leão não
concordaria com isso. Ele atribui o erro dos hereges não a obscuridade do texto
sagrado, mas às características dos próprios hereges.
Gregório
o Grande (540-603)
Pois assim como a palavra de Deus, pelos
mistérios que contém, exercita a compreensão dos sábios, de modo geral pelo que
apresta de si mesma, também nutre o
simplório. Ela apresenta num dia
claro aquilo com o qual pequeninos podem ser alimentados; e guarda em
segredo aquilo que homens de uma classe mais elevada podem ficar em suspense de
admiração. É, por assim dizer, uma espécie de rio, se assim posso compará-lo,
que é tanto superficial e profunda, em que tanto o cordeiro pode encontrar
equilíbrio, como o elefante flutua. (Morals on the Book of Job by S. Gregory the Great: A Library of Fathers
of the Holy Catholic Church, Vol. 1, Parts 1 & 2 (Oxford: John Henry
Parker, 1844), Preface, p. 9)
Gregório foi bispo de Roma. Diz-nos que a Escritura exercita a mente dos
sábios, pois tem grandes mistérios, mas ainda assim nutre os mais simples, de
forma que os alimenta em sentido espiritual. As metáforas de Gregório implicam
em perspicácia da palavra escrita.
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