A ideia desse artigo surgiu do pedido de um
leitor chamado Marcos Monteiro. Ele nos indicou o link de um artigo do site
apologistas católicos que respondia ao site protestante conhecereis a verdade.
O site protestante demonstrou que Agostinho não cria em doutrinas católicas
fundamentais como:
1) A eficácia ex opere operato dos
sacramentos,
2) O culto às imagens,
3) A infalibilidade do Papa,
4) A confissão auricular como sacramento,
5) A imaculada conceição de Maria,
6) A transubstanciação,
7) A missa como repetição do sacrifício de
Cristo,
8) O primado de jurisdição do bispo de Roma
sobre a igreja universal.
Recomendo a leitura dos comentários desse
artigo. Então, o apologista católico respondeu demonstrando que Agostinho não
era protestante, mas um convicto católico romano que acreditava em todas as
basilares doutrinas do romanismo. Antes de tudo, é preciso esclarecer que o
autor protestante assim como outros não consideram o bispo de hipona um
protestante, no sentido de que ele cria em todas as doutrinas basilares da
reforma. Da mesma forma, é errôneo acreditar que ele era um católico romano,
pois como veremos, desacreditava de doutrinas fundamentais do romanismo.
Podemos discutir para que lado ele tendia, mas é anacrônico encaixa-lo como
pertencente integralmente a qualquer dessas religiões. Ele era um cristão da
Igreja norte africana do século V, sendo sob esse contexto que iremos
analisá-lo. Entendemos que Agostinho foi representado de forma distorcida pelo
católico. Por isso, essa série de artigos irá abordar, na medida do possível
imparcialmente, o pensamento desse pai da Igreja a respeito de diversas
doutrinas que dividem católicos e protestantes.
Agostinho foi sem dúvida o mais influente
teólogo da igreja ocidental. Ele é bem quisto tanto por católicos como
reformados. Apesar da sua influência e genialidade teológica, não pode ser
considerado uma testemunha histórica qualificada, pois viveu de 354-430, quase
três séculos após a era apostólica. Seu testemunho histórico não pode ser
comparado ao de Clemente, Inácio ou Policarpo que eram mais próximos da era
apostólica e provavelmente conheceram alguns dos apóstolos. Esta será uma
grande oportunidade de avaliarmos o status de certas doutrinas no período final
do séc. IV e início do séc. V. Nesse primeiro artigo vamos discutir o papado.
A questão da
autoridade é a mais importante, a partir dela todas as demais distinções entre
católicos e protestantes derivam. Esse é um item que o apologista católico
distorceu Agostinho. No item 8, ele traz algumas citações em que Pedro é
chamado de a rocha como prova de que o bispo de Hipona acreditava no papado, ou
seja, o bispo de Roma exercia primazia jurisdicional sobre toda a Igreja. Antes
de tudo, é preciso dizer que alguém considerar que Pedro era a rocha não
implica em papado. Alguns autores protestantes como D.A Carson interpretam
Pedro como a rocha, mas não acreditam que isso implique em papado. Cipriano,
muito estimado por Agostinho, interpretava que Pedro era a rocha, mas não
entendia que ele exercia jurisdição sobre os demais apóstolos. Ademais, para
Cipriano, todos os bispos e não apenas o de Roma eram sucessores de Pedro.
Orígenes interpretou Pedro como a rocha, mas compreendia que qualquer cristão
que também confessasse o mesmo que Pedro, deveria ser chamado de rocha. Ou
seja, essa intepretação de Mateus 16:18 é necessária, mas não suficiente para
provar o papado. Os católicos precisam provar que Pedro exercia primazia
jurisdicional, em outras palavras, que por ordenação de Cristo, ele mandava nos
demais apóstolos. Mas só isso não é suficiente para a causa papal, também
precisam provar que o bispo de Roma é o exclusivo sucessor da suposta primazia
petrina. Além de Agostinho não ter ensinado que Pedro tinha primazia
jurisdicional como o católico alega, ele se retratou dessa interpretação e
passou a dizer que a rocha era a confissão de Pedro:
Numa
passagem neste livro, eu disse sobre o Apóstolo Pedro: ‘Sobre ele, como uma
pedra, a Igreja foi construída'... Mas eu sei que mui frequentemente em um
tempo atrás, eu expliquei que o Senhor disse: ‘Tu és Pedro, e sobre esta pedra
edificarei minha Igreja', que é para ser
entendido como construída sobre Ele, a quem Pedro confessou dizendo: ‘Tu és
o Cristo, o Filho do Deus vivo', e assim
Pedro, chamado depois esta pedra, representou a pessoa da Igreja que é
construída sobre esta pedra, e recebeu ‘as chaves do reino do céu'. Porque, ‘Tu és Pedro' e não ‘Tu és a pedra'
foi dito a ele. Mas ‘a pedra era
Cristo', em quem confessando, como também toda a Igreja confessa, Simão foi
chamado Pedro. Mas que o leitor decida qual dessas duas opiniões é a mais
provável. (The Fathers
of the Church (Washington D.C., Catholic University, 1968), Saint
Augustine, The Retractations Capítulo
20.1)
A pedra era o Cristo
que Pedro confessou. Assim como Cipriano, Agostinho entendia que Pedra era
figura da Igreja, e não o seu regente máximo. Logo, as chaves não foram
transferidas de Pedro exclusivamente para o bispo romano, mas para toda a
Igreja. A igreja não estava fundada sobre um homem, mas sobre Cristo, assim,
qualquer reivindicação papal sob o testemunho de Agostinho se torna
improcedente. O bispo de Hipona continua:
Porque
os homens que desejavam edificar sobre
homens, diziam, ‘Eu sou de Paulo; e eu de Apolo; e eu de Cefas, que era Pedro. Mas
outros que não desejavam edificar sobre Pedro, mas sobre a Pedra, diziam, ‘Mas
eu sou de Cristo'. E quando o Apóstolo Paulo averiguou que ele foi
escolhido, e Cristo desprezado, ele disse, ‘Está Cristo dividido? Foi Paulo
crucificado por vós? Ou fostes vós batizados em nome de Paulo?' E, como não no
nome de Paulo, assim nem também no nome de Pedro; mas no nome de Cristo: que Pedro deveria ser edificado sobre a
Pedra, não a Pedra sobre Pedro. Este mesmo Pedro, portanto, que tinha sido
declarado ‘bem-aventurado' pela Pedra, carregando a figura da Igreja. (Philip Schaff, Nicene and Post-Nicene Fathers (Grand
Rapids: Eerdmans, 1956), Volume VI, St. Augustin, Sermon XXVI.1-4, pp.
340-341).
Agostinho condena
precisamente o que os católicos romanos fazem – edificar a Igreja sobre um
homem. Ele atribuía alguma primazia a Pedro? A resposta é sim, mas essa não
implica em papado nem em primado jurisdicional. Isso fica claro a partir das
citações abaixo:
Antes
de Sua paixão, o Senhor Jesus, como você sabe, escolheu aqueles discípulos dos
Seus, os quais chamou apóstolos. Entre
aqueles foi somente a Pedro que em quase toda a parte foi dado o privilégio de
representar toda a Igreja. Foi na pessoa de toda a Igreja, que ele sozinho
representou, que ele foi privilegiado em ouvir, ‘Dar-te-ei as chaves dos céus'
(Mateus 16:19). Depois de tudo, não foi
somente um homem que recebeu aquelas chaves, mas a Igreja em sua unidade.
Assim, está é a razão da preeminência
reconhecida de Pedro, de que ele estava representando a universalidade e
unidade da Igreja, quando lhe foi dito, ‘A você, estou confiando', que de
fato tem sido confiado a todos. (Sermão 295)
Previamente,
é claro, ele foi chamado Simão; este nome de Pedro lhe foi concedido pelo
Senhor, e isto com a intenção simbólica
de sua representatividade da Igreja. Porque Cristo, você vê, é a petra ou pedra; Pedro, ou
Rochoso, é o povo Cristão. (Sermão 76)
Ele não poderia ser
mais claro. O primado Pedro não era jurídico, nem tinha qualquer implicação
papal. Ele era o primeiro porque foi escolhido por Cristo para representar a
Igreja. Um erro comum cometido por apologistas católicos é atribuir tudo o que
é dito sobre Pedro automaticamente e exclusivamente aos bispos de Roma. Os pais
poderiam ter uma visão elevada de Pedro e não atribuir integralmente e exclusivamente
essa visão aos bispos de Roma:
Porque,
como algumas coisas são ditas que parecem peculiarmente se aplicar ao Apóstolo
Pedro, e todavia não são claras em seu
significado, a menos quando se refere à Igreja, a quem ele é reconhecido ter figurativamente representado, por causa da primazia que ele tinha entre
os Discípulos; como está escrito, ‘Dar-te-ei as chaves do reino dos céus',
e outras passagens de propósito semelhante: assim Judas representa aqueles
Judeus que eram inimigos de Cristo. (Exposição sobre o Livro de
Salmos, Salmos 199)
Muitas coisas ditas
sobre Pedro aplicam-se a toda a Igreja e não singularmente ao bispo de Roma. As
chaves que são o elemento principal desse debate pertencem a toda a Igreja e
não apenas ao bispo de Roma. Numa última tentativa de tentar resguardar a
errônea ideia do Agostinho católico romano, os católicos apelam ao trecho: “Mas que o leitor decida qual dessas duas
opiniões é a mais provável”. Esse trecho só reforça que ele não era
papista. Nesse período, o papa Dâmaso já havia utilizado o texto de Mateus
16:18 para reivindicar autoridade sobre a Igreja. Se Agostinho de fato acreditasse
em infalibilidade papal, não teria mudado sua interpretação do texto. Ele
estava convicto de sua interpretação, e o fato de apelar à consciência do
leitor só demonstra que não condenava o livre exame. Que católico romano diria
para alguém escolher qual a interpretação correta dessa passagem? John Rotelle,
o editor da série Católica Romana dos sermões de Agostinho, faz estas observações:
Pedro
existia, e ele não tinha sido ainda confirmado na pedra': Isto é, em Cristo,
como participante em seu ‘rochedo' pela fé. Isto não significa confirmado como
a pedra, porque Agostinho
nunca pensou de Pedro como a pedra. Jesus, apesar de tudo, não lhe
chamou de fato a pedra...mas ‘Rochoso'. A pedra na qual ele construiria sua
Igreja, era, para Agostinho, tanto o próprio Cristo como a fé de Pedro,
representando a fé da Igreja. (John Rotelle, Ed., The Works of Saint
Augustine (New Rochelle: New City, 1993), Sermons, Sermon
265D.6, p. 258-259, n. 9)
W.H.C. Frend afirma o consenso acima sobre a
eclesiologia de Agostinho e sua interpretação da comissão de Pedro:
Agostinho...rejeitou
a ideia de que ‘o poder das chaves' tinham sido confiado somente a Pedro. Sua primazia era simplesmente uma questão
de privilégio pessoal, e não um ofício. Similarmente, ele nunca reprovou os Donatistas por não terem comunhão com Roma, mas
pela falta de comunhão com a visão apostólica como um todo. Sua visão do
governo da Igreja era que questões menos importantes deveriam ser resolvidas
por concílios provinciais, grandes questões em concílios gerais. (W.H.C. Frend, The Early Church (Philadelphia:
Fortress, 1965), p. 222)
Para um tratamento
mais detalhado aqui. O site veritatis traz alguns textos adicionais em favor do papado:
Se a
sucessão dos bispos for levada em conta, quanto mais certa e benéfica a Igreja
que nós reconhecemos chegar até o próprio Pedro, aquele que portou a figura da
Igreja inteira, a quem o Senhor disse: 'Sobre esta pedra edificarei a minha
Igreja e as portas do inferno não prevalecerão contra ela'. O sucessor de Pedro
foi Lino, e seus sucessores em ordem de sucessão ininterrupta foram estes:
Clemente, Anacleto, Evaristo, Alexandre, Sisto, Telésforo, Higino, Aniceto,
Pio, Sótero, Eleutério, Victor, Zeferino, Calisto, Urbano, Ponciano, Antero,
Fabiano, Cornélio, Lúcio, Estêvão, Sisto, Dionísio, Félix, Eutiquiano, Caio,
Marcelino, Marcelo, Eusébio, Miltíades, Silvestre, Marcos, Júlio, Libério,
Dâmaso e Sirício, cujo sucessor é o presente bispo Anastácio. Nesta ordem de
sucessão, nenhum bispo donatista é encontrado. (Santo
Agostinho, Ep. 53,2)
Apenas mais uma
citação que não prova o papado. Agostinho detinha a crença errônea de que Pedro
foi bispo em Roma e que deixou nessa cidade uma sucessão de bispos. Como já
demonstrado aqui, Pedro não foi bispo de Roma e sequer havia bispo monárquico nessa
igreja até metade do séc. II. De qualquer forma, o veritatis antes teria que
provar que Pedro detinha um primado jurisdicional e não apenas de honra na
visão de Agostinho, só assim essa sucessão de bispos seria relevante para a
causa papal. Outras citações irrelevantes são trazidas como Agostinho se
referindo à Igreja romana como UMA cátedra apostólica e não A cátedra como
alguns católicos erroneamente traduzem. Obviamente ninguém duvida disso, afinal
Roma contou com a pregação dos apóstolos Pedro e Paulo. O que não se prova é
que o bispo de Roma fosse um papa infalível. Leve-se em conta também que outras
Igrejas como Antioquia e Jerusalém eram cátedras apostólicas. O veritatis ainda
traz citações em que Agostinho se dirige ao bispo romano de forma elogiosa e a
opinião de um autor protestante confirmando a primazia da sé romana. Agostinho
de fato dava a sé romana uma primazia, mas essa não tinha a ver com o papado, e
muito menos considerava a autoridade da sé romana vinculante por si própria ou
infalível. Que o autor protestante não estava falando de papado fica claro aqui. O autor católico traduzido pelo veritatis responde ao próprio César Vidar que havia demitido Agostinho como testemunha do papado. É o velho costume dos católicos lerem qualquer coisa com as "lentes de Roma". Eles viram a palavrado primado e já concluíram sem maior análise que se tratava de papado. O bispo de Hipona também escreveu:
Portanto,
se Pedro, sobre como fazendo isso, é corrigido pelo seu mais tarde colega Paulo,
e ainda é preservada [a amizade de Paulo] pelo vínculo da paz e da unidade até
que ele é promovido ao martírio, quanto
mais prontamente e constantemente devemos preferir, ao invés da autoridade de
um único bispo ou o concílio de uma única província, a regra que foi
estabelecida pelos estatutos da Igreja universal? (...) [citando Cipriano] Pois nenhum de nós coloca-se
como um bispo de bispos, nem por terror tirânico alguém força seu colega à
obediência obrigatória; visto que cada bispo, de acordo com a permissão de sua
liberdade e poder, tem seu próprio direito de julgamento, e não pode
ser julgado por outro mais do que ele mesmo pode julgar um ao outro. Mas
esperemos todos o julgamento de nosso Senhor Jesus Cristo, que é o único que tem o poder de nos
designar no governo de Sua Igreja, e de nos julgar em nossa conduta nela.
(Sobre o Batismo, contra os donatistas, 2:2)
Bem,
vamos supor que aqueles bispos que
decidiram o caso em Roma não eram bons juízes, ainda resta o concílio plenário da Igreja universal, em que esses
juízes podem apresentar sua defesa, de modo que, se eles foram condenados por
erro, as suas decisões podem ser
revertidas. (Carta 43:19)
Ele tinha Cipriano como um mestre e concordou
com ele na questão da autoridade. Cipriano foi uma grande testemunha da
resistência da igreja norte-africana contra as pretensões papais do bispo
romano Estevão. Tratamos desse assunto aqui. Para o bispo de Hipona, a
autoridade máxima para resolução de controvérsias na Igreja não era o bispo de
Roma, mas o concílio ecumênico. Ele também não defendia o atual ensino papista
de que o concílio ecumênico só é válido se convocado ou presidido pelo Papa,
tendo em vista que nenhum dos sete primeiros concílios ecumênicos atendeu a esse
critério. Robert Eno, historiador católico romano e especialista em Agostinho,
comenta:
Em
outro lugar eu argumentei em detalhes a visão de Agostinho sobre a autoridade
na Igreja e que, na minha opinião, o
concílio [não o Papa] foi o principal instrumento para resolução de
controvérsias .... Eu acredito que Agostinho tinha grande respeito pela
igreja romana cuja antiguidade e origens apostólicas ofuscou, de longe, outras
igrejas no Ocidente. Mas assim como em
Cipriano, a tradição colegial e conciliar africana foi preferida na maioria das
vezes. (The
Rise of the papado [Wilmington, Delaware: Michael Glazier, 1990]., p. 79)
Eno também
escreve:
É
claro que Agostinho tinha um respeito genuíno para a posição da igreja de Roma
na Igreja universal. Na verdade, seus pontos de vista eram provavelmente mais
amigáveis do que os de muitos de seus colegas africanos. Agostinho, afinal de
contas, tinha um conhecimento pessoal da
cidade, bem como de alguns clérigos romanos. Não obstante, sua ação na crise
pelagiana não alterou sua visão básica
do concílio plenário como a última instância em disputas na Igreja, nem a sua
visão da atividade conciliar em geral como o caminho comum para resolver
problemas intra-eclesiais além do nível da igreja local (...) Pedro foi o
primeiro dos Apóstolos, segurando o Principatus do Apostolado. Mas, qualquer Apóstolo seria maior do que
qualquer bispo como o Apostolado é maior do que o episcopado. (“Doctrinal Authority In Saint Augustine",
Augustinian Studies, Vol. 12 - 1981, pp. 171)
O historiador protestante Philip Schaff
escreveu:
Agostinho
sem dúvida compreendia por igreja a Igreja Católica visível, descendente dos
apóstolos, especialmente a partir de Pedro, através da sucessão de bispos, e de
acordo com o uso de seu tempo, ele
considerou a igreja romana como tendo eminência entre as sedes apostólicas.
Mas, por outro lado, como Cipriano e Jerônimo, ele insiste na unidade essencial
do episcopado, e insiste que as chaves do reino dos céus foram dadas não a um
único homem, mas a toda igreja, que Pedro estava apenas representando. Com esta visão concorda a posição
independente da igreja norte-africana no tempo de Agostinho em relação a Roma,
como já observado no caso do recurso de Apiarius, e como ela aparece na
controvérsia pelagiana, de que Agostinho era o líder. Este pai, portanto, pode de fato ser citado apenas como um
testemunho da autoridade limitada da cadeira romana. E deve também
justamente ser observado, que em seus numerosos escritos, ele raramente fala dessa autoridade, e em sua maior parte
incidentalmente, mostrando que ele dava muito menos importância a esse
assunto do que os teólogos romanos. (The Master Christian Library [Albany, Oregon: AGES
Software, 1998], History of the Christian Church, Vol. 3, p. 246)
Visto que Agostinho não defendia o papado,
nem seria necessário abordar o tema infalibilidade papal. Mas o site
apologistas católicos distorceu tão grosseiramente o erudito patrístico J.N.D
Kelly, que é obrigação moral trazer o verdadeiro pensamento desse autor. O
católico diz:
De
acordo com as declarações de JND Kelly, podemos tirar as seguintes conclusões,
sobre o pensamento de Santo Agostinho:
1) O
Bispo de Roma, como sucessor de São Pedro, tem
a primazia jurisdicional da Igreja;
2) o
Papa nesta posição tem a palavra final em questões de doutrina, e foi de fato o
árbitro final da verdade e, portanto,
infalível.
Ainda que o autor anglicano tivesse dito que
o bispo de Roma tinha primazia jurisdicional, coisa que ele não disse, o
argumento é falacioso. Como já visto, Agostinho entendia que o árbitro final
nas controvérsias era o concílio ecumênico e não o papa. Mas ainda que façamos essa
concessão, é sabido que autoridade não implica em infalibilidade. Esse é um
erro comum no meio católico. Existem autoridades instituídas por Deus que não
são infalíveis. A Escritura nos diz que devemos obedecer aos pais e o
magistrado civil, afirmando inclusive que ambos, família e governo, são
instituições divinas. Alguém em sã consciência diria que essas instituições são
infalíveis? O mesmo se aplica à Igreja. Não é ensinado por Cristo ou algum
apóstolo que uma Igreja local seria infalível, pelo contrário, o Novo
Testamento é abundante em exortações e exemplos de apostasia das igrejas
cristãs. Por isso, a autoridade da família, do governo e da Igreja, cada um
dentro de suas esferas, é condicional à autoridade final e infalível da
Escritura. Vejamos Kelly em contexto:
Em
todos os lugares, tanto no oriente como no ocidente, Roma desfrutava de um prestígio especial, conforme se vê na precedência
que lhe atribuíam sem nenhum questionamento (...) A questão crucial, porém,
é se esse inquestionável primado de
honra era ou não aceito como um direito divino, de modo a envolver uma
jurisdição global. No que diz respeito
ao Oriente, a resposta deve ser em geral negativa. Embora demonstrasse imensa
deferência à Sé romana pela sé romana e desse grande valor aos seus
pronunciamentos, as Igrejas orientais
jamais trataram Roma como o centro constitucional e a cabeça de toda a igreja,
muito menos como um oráculo infalível nos assuntos de fé e moral; por vezes,
não tinham o menor constrangimento em resistir a sua vontade expressa. (J.N.D
Kelly, Patrística, Origem e desenvolvimento das doutrinas centrais da
fé cristã (Editora Vida Nova, 1994), pág. 308)
Kelly, chamado pelo apologista católico de “estudioso protestante renomado: J.N.D.
Kelly, que é dos maiores estudiosos patrísticos do século XX”, disse
claramente que não havia papado na Igreja Católica antiga, uma vez que um elemento
primordial do papado é a jurisdição universal. Sobre a eclesiologia de
Agostinho:
Não
é preciso dizer que Agostinho identifica a Igreja como a Igreja Católica de seus dias, com sua hierarquia e sacramentos, e com
seu centro em Roma. (Ibid., p. 313)
Agostinho se refere à Igreja Católica de seu
tempo e considerava a sede apostólica romana como a primeira entre as outras
sedes. Nada disso implica em papado, muito menos infalibilidade papal. Kelly
observa que esse conceito de Igreja evoluiu no pensamento de Agostinho. Nos
últimos anos ele passou a entender a Igreja como a totalidade dos eleitos,
constituída de pessoas que sequer poderiam estar dentro da Igreja institucional
num dado momento. Esse ponto de vista se aproxima bastante da eclesiologia
reformada:
No
entanto, ao desenvolver sua doutrina da predestinação, Agostinho foi levado a
introduzir um refinamento nessa distinção entre a igreja visível e invisível.
Por fim, ele acabou reconhecendo que os
únicos verdadeiros membros da igreja (...) poderiam ser “o número fixo dos eleitos”. Mas “na presciência
inefável de Deus, muitos que parecem estar dentro estão fora, e muitos que
parecem estar fora estão dentro”. Em outras palavras, até mesmo dentre aqueles que,
em todos os aspectos parecem pertencer à “comunhão invisível de amor”, muitos
podem não possuir a graça da perseverança e estão, portanto, destinados a se
perder; por outro lado, muitos outros,
que no presente momento, talvez sejam hereges ou cismáticos, tenham vidas
desregradas ou sejam até pagãos inconversos podem estar predestinados à
plenitude da Igreja (...) Agostinho jamais tentou harmonizar seus dois
conceitos, o de fazer distinção entre a igreja histórica e a igreja verdadeira
daqueles realmente consagrados a Cristo e que manifestam seu espírito, e o de
identificar o corpo de Cristo com o número fixo dos eleitos conhecido apenas
por Deus. De fato, é duvidoso que, em última instância, fosse possível fazer
alguma síntese, pois, caso esta doutrina
seja levada a sério, a noção de igreja institucional perde toda validade. (Ibid.,
p. 316)
Sobre a primazia da Igreja romana no
ocidente, Kelly escreve:
Nós
meados do quinto século, a igreja romana
havia estabelecido uma posição de primazia no Ocidente, tanto de direito como
de fato, e as pretensões papais de supremacia sobre todos os bispos da
cristandade haviam sido formuladas em ter precisos. A narrativa detalhada das
etapas pelas quais esse processo foi cumprido pertence na verdade ao campo da
história da igreja, e não ao campo da história doutrinas. Aqui, precisamos
apenas comentar que, deixando de lado fatos estritamente teológicos, a posição de Roma como a antiga e estimada
capital e com única sé apostólica no Ocidente, a ampla influência litúrgica e
teológica que exercia no império ocidental, e o papel especial que os papas
foram chamados desempenhar na época das invasões bárbaras — tudo contribuiu
para desdobramento. Quem acompanha a história da época, especialmente as controvérsias
ariana, donatista, pelagiana e cristológica, não deixa de ficar impressionado
com capacidade e a persistência com que a Santa Sé apresentava e consolidava
continuamente suas reivindicações. Uma
vez que seu ocupante era aceito corno sucessor de Pedro, o príncipe dos
apóstolos, foi fácil inferir que a autoridade que Roma de fato desfrutava,
e que os papas viam concentrada em suas pessoas e seu ofício, era simplesmente
o cumprimento do plano divino. (Ibid., p. 316)
Kelly nos dá valiosas informações, mas
absolutamente nenhuma delas implica na doutrina papal. Ele explica que Roma
tinha uma autoridade única no ocidente por motivos não papais: antiga capital
do império, única sede apostólica do ocidente, influência teológica e
litúrgica, papel político, atuação incisiva nas controvérsias cristológicas e
por último o reconhecimento de que o bispo de Roma era sucessor de Pedro. Já
vimos que os pais da Igreja não viam Pedro como uma papa, eles davam ao
apóstolo uma posição de honra no colégio apostólico, por isso o consideravam
príncipe dos apóstolos, mas não concediam a ele autoridade jurisdicional sobre
os demais. Ademais, nem tudo que era aplicado a Pedro era transferido aos bispos
de Roma. Apesar de no século IV ter aparecido pela primeira vez a ideia de que
Pedro foi bispo de Roma, observa-se que as listas mais antigas não colocam esse
apóstolo como bispo de Roma. A lista de Irineu (séc. II) colocava Lino como
primeiro bispo, sendo que Pedro e Paulo em igualdade de posição são colocados
como os fundadores dessa Igreja. Que essa primazia de honra da Igreja romana
não implicava em papado ou infalibilidade papal vemos a seguir:
Enquanto
isso, a doutrina que prevalecia na
África era um desdobramento dos conceitos de Cipriano (...) A atitude de
Agostinho não foi diferente. Acompanhando Cipriano, ele considerava Pedro o
representante ou o símbolo da unidade da Igreja e do colégio apostólico, e também o apóstolo a quem foi dado a
primazia (mesmo assim ele era um tipo da igreja como um todo). Desse modo,
a Igreja romana, a cátedra de Pedro, “a quem o senhor, depois de sua
ressurreição, incumbiu de alimentar suas ovelhas”, era para ele a Igreja em que
“a primazia da cadeira apostólica sempre esteve presente”. As três cartas referentes ao pelagianismo que
a igreja africana enviou em 416 a Inocêncio I, das quais Agostinho foi o
redator, sugerem que ele atribuía ao papa uma autoridade pastoral e didática
que se estendia sobre toda a Igreja, tendo encontrado base para isso nas
Escrituras. Ao mesmo tempo, não existem
dados de que ele estivesse disposto a atribuir ao bispo de Roma, em sua
condição de sucessor de Pedro, um magistério doutrinário soberano e infalível.
Por exemplo, quando apelou a Inocêncio em sua controvérsia com Juliano de
Eclano, sua concepção era que o papa
seria apenas o porta-voz de verdades que a igreja romana, desde épocas antigas,
sustentava em harmonia com outras igrejas católicas. Em assuntos práticos, ele também não estava disposto a abri mão,
mesmo em questões insignificantes, da independência disciplinar da igreja
africana, que Cipriano havia defendido com tanta intrepidez em sua época. A
verdade é que a doutrina da primazia romana desempenhou um papel secundário em sua eclesiologia, como também em seu
pensamento religioso pessoal. (Ibid., p. 318)
Esse é o autor que nosso interlocutor católico
coloca como evidência da infalibilidade papal. Kelly negou explicitamente que o
bispo de Hipona tenha defendido essa doutrina. Roma tinha uma autoridade maior
do que outras igrejas na visão de Agostinho, mas essa autoridade não era
soberana e infalível, além do mais, tal primazia que não era papal, desempenhou
um papel secundário em sua eclesiologia. Que católico romano consideraria a
autoridade de Roma secundário em matéria de eclesiologia? O papista
necessariamente deve considerá-la o elemento central da doutrina da igreja.
Ainda sobre infalibilidade, Agostinho é
citado em vários sites católicos da seguinte forma: “Roma falou, causa
encerrada”. Essa é uma reelaboração das palavras do teólogo latino, e se
olharmos o contexto dessa citação, longe de provar a infalibilidade papal, o
refuta. Tratamos disso num artigo a parte aqui. Vamos ao testemunho de Klaus
Schatz, um proeminente teólogo e historiador católico romano, que escreveu:
No caso do Norte de África é interessante
observar a atitude de uma igreja autoconfiante e organizacionalmente intacta em
relação a Roma. A declaração do Bispo Agostinho de Hipona
(396-430), Roma locuta, causa finita ("Roma falou, o assunto está
resolvido") foi citada repetidamente. No entanto, a citação é
realmente uma ousada reformulação das palavras do pai da igreja tomadas
completamente fora de contexto (...) Tanto o contexto dessa declaração e
sua continuidade com o resto do pensamento de Agostinho não permite outra
interpretação que não seja a de que o veredicto de Roma somente não é decisivo;
em vez disso, dispõe de todas as dúvidas depois de tudo que a precedeu. Isso é
porque não restava nenhuma outra autoridade eclesiástica de qualquer
consequência para quem os pelagianos poderiam apelar, e em particular a própria
autoridade da qual eles poderiam mais facilmente ter esperado uma decisão
favorável, ou seja, Roma, tem claramente decidido contra eles! (...) Em geral,
Agostinho atribui um peso relativamente importante de autoridade para a igreja
romana em questões de fé, mas não considera que ela tenha um ofício
superior de ensino. Tem auctoritas, mas não potestas sobre a Igreja
no Norte da África. Os próprios concílios acima mencionados dão uma imagem
clara da forma como os africanos, incluindo Agostinho, consideravam a
autoridade de ensino de Roma. Eles enviaram seus registros a Roma não
para obter a confirmação formal, mas porque reconheciam que a Igreja Romana,
com a sua tradição, tinha um auctoritas recebido em questões de fé; portanto,
eles desejavam ter uma decisão Romana junta com a sua própria. Isso é
especialmente evidente em uma carta de Agostinho escrita para cinco bispos:
“não estamos, disse ele, derramando nossa pequena gota de volta para sua ampla
fonte para aumenta-la, mas (...) nós desejamos ser reafirmados por vocês a
respeito destas nossas gotas, que escassas todavia, fluem a partir da mesma
fonte que seu córrego abundante, e nós desejamos o consolo de seus escritos,
tirados de nossa comum partilha da mesma graça”. Toda a Palavra desta deve ser
observada: a igreja romana não é a fonte da igreja africana, pois ambos,
em fluxos paralelos, fluem do rio da mesma tradição, mesmo que o rio seja mais
completo na igreja romana. Roma tem, assim, uma autoridade relativamente
maior e mais importante, sendo por isso que a Igreja Africana procura um
veredicto de Roma. Na resposta do Papa Inocêncio, é manifesta
a diferença entre as duas concepções, romana e africana. O papa interpreta
a pergunta dos bispos africanos como um pedido de ratificação e fala que toda
água flui do manancial da igreja romana (portanto, não no sentido de correntes
paralelas, mas da dependência em relação à Roma). Sublinha também que as
questões de fé só podem ser definitivamente resolvidas por Roma. Aqui aparece
Roma como a última e decisiva instância em matéria de fé. Na verdade, a "causa" não foi encerrada,
pois sob o próximo papa, Zósimo, os pelagianos conseguiram audiência em Roma
para defender sua ortodoxia. Agostinho então não esperou a decisão de Roma, mas
convocou um novo concílio em Cartago (418) que condenou oficialmente algumas
doutrinas pelagianas. Essa decisão foi comunicada a Roma, e em seguida, o papa
ratificou a decisão de Cartago. (Papal Primacy, Minnesota:
The Liturgical Press, 1996, p. 34-35)
O estudioso
católico romano confirma o consenso a respeito. Klaus Schatz usou as expressões
“Auctoritas” para se referir à autoridade da Igreja Romana e mencionou que não
tinha “potestas”. Essas expressões são do direito romano. Autorictas envolve a
autoridade de alguém que possui excelência moral ou notório saber em algo. Eu
mesmo fiz uso dessa ao citar Klaus Schatz. Ele possui “autorictas” porque é um
estudioso do assunto, portanto, sua opinião tem maior peso, ainda mais quando
vai contra a opinião de sua própria denominação. Potestas seria a autoridade institucionalmente
e vinculantemente constituída. Um juiz tem este tipo de autoridade, sua
autoridade nasce do poder legal, sendo obrigatória. Ao citar Klaus, não estou
lhe concedendo este tipo de autoridade, pois apesar de reconhecer que ele tem
notório saber no assunto, não considero sua opinião obrigatória ou infalível.
Esta distinção é
fundamental para entender a autoridade exercida pela Igreja Romana nos tempos
de Agostinho. Ela era a Igreja mais importante do ocidente e detinha
grande prestígio juntamente com as outras sedes apostólicas (Alexandria,
Antioquia, Constantinopla e Jerusalém). Sua posição tinha peso, mas não era
considerada infalível ou vinculativa por si mesma. Por isso, nas
controvérsias, era comum que a Igreja Romana e as outras Sedes Apostólicas
fossem consultadas. Assim foi no caso do arianismo, pelagianismo, monofissimo e
outras heresias. Porém, caso a Igreja consultada decidisse de forma contrária à
posição apoiada pela Igreja apelante, essa não necessariamente mudaria sua
posição, pois não considerava a decisão da Sede Apostólica infalível ou
vinculativa. Esse foi o caso da Igreja Norte Africana. Quando o bispo Romano
Zózimo voltou atrás da condenação ao pelagianismo, os norte africanos não
mudaram sua posição e se mantiveram firmes na condenação à heresia. O certo
seria dizer: “Roma falou e a causa não encerrou”. Schatz ainda traz outro episódio em que “Roma
falou e a causa não encerrou”:
A igreja africana preservou sua autonomia de modo ainda mais decidido no terreno da jurisdição. Nos conselhos de Cartago realizados em 419 e 424, se chega a proibir o recurso a Roma. O contexto dessa medida foi o caso do presbítero Apiario, que tinha sido excomungado pelo seu bispo e, em Roma (sem o conhecimento da situação) foi reabilitado em seus direitos. Os norte-africanos reagiram, por um lado, concedendo aos presbíteros a possibilidade de uma instância de recurso (o julgamento de seu bispo pelo concílio norte-africano de Cartago), com o qual se satisfazia o desejo de segurança jurídica. Por outro lado, se defendem energicamente contra uma intervenção Roma: ela de longe incorria em julgamentos errados, pela simples razão de que em tais processos judiciais era impossível fazer chegar da África as testemunhas necessárias. Além disso, é impensável que Deus conceda o espírito de juízo justo a um particular, isto é, o bispo de Roma, e não a todo um concílio de bispos. Por isso, os norte-africanos proibiram para o futuro qualquer recurso "ultramarino", mesmo para o caso dos bispos, opondo-se assim os cânones de Sárdica. Essa proibição tinha um precedente no caso de um bispo afastado de sua comunidade, mas que Roma tinha amparado. Por causa disso, o mesmo Agostinho ameaçou se demitir. A instância de recurso era apenas o concílio norte-africano de Cartago. Este caso repetidamente fornecido ao longo da história oferece o exemplo para apoiar a resistência episcopalista das igrejas nacionais contra o centralismo romano. (ibid., 35-36)
A igreja africana preservou sua autonomia de modo ainda mais decidido no terreno da jurisdição. Nos conselhos de Cartago realizados em 419 e 424, se chega a proibir o recurso a Roma. O contexto dessa medida foi o caso do presbítero Apiario, que tinha sido excomungado pelo seu bispo e, em Roma (sem o conhecimento da situação) foi reabilitado em seus direitos. Os norte-africanos reagiram, por um lado, concedendo aos presbíteros a possibilidade de uma instância de recurso (o julgamento de seu bispo pelo concílio norte-africano de Cartago), com o qual se satisfazia o desejo de segurança jurídica. Por outro lado, se defendem energicamente contra uma intervenção Roma: ela de longe incorria em julgamentos errados, pela simples razão de que em tais processos judiciais era impossível fazer chegar da África as testemunhas necessárias. Além disso, é impensável que Deus conceda o espírito de juízo justo a um particular, isto é, o bispo de Roma, e não a todo um concílio de bispos. Por isso, os norte-africanos proibiram para o futuro qualquer recurso "ultramarino", mesmo para o caso dos bispos, opondo-se assim os cânones de Sárdica. Essa proibição tinha um precedente no caso de um bispo afastado de sua comunidade, mas que Roma tinha amparado. Por causa disso, o mesmo Agostinho ameaçou se demitir. A instância de recurso era apenas o concílio norte-africano de Cartago. Este caso repetidamente fornecido ao longo da história oferece o exemplo para apoiar a resistência episcopalista das igrejas nacionais contra o centralismo romano. (ibid., 35-36)
Conclusão
Encerramos a parte de 1 de nossa série.
Podemos concluir confiavelmente sobre Agostinho:
1. Ele tinha a igreja romana
em alta conta, mas não considerava seu bispo uma autoridade soberana e
infalível;
2. Agostinho, como Cipriano, atribuía uma primazia de honra a Pedro,
pois via nele um representante de toda a Igreja, mas não o considerava uma
autoridade jurídica sobre os demais apóstolos;
3. A maior autoridade dentro
da Igreja para resolver controvérsias doutrinais era o concílio plenário e não o
bispo de Roma.
No próximo artigo trataremos
dos temas tradição, sola scriptura e autoridade da Igreja. Responderemos a
pergunta básica: “Agostinho acreditava que a autoridade da Igreja ou tradição estava no mesmo patamar da
Escritura?” Foi visto que o concílio era a autoridade suprema dentro da Igreja,
mas ele considerava as decisões conciliares infalíveis? Ele defendeu uma
posição similar à posição reformada da Sola Scriptura?