Os
apologistas católicos defendem que Celestino (bispo de Roma) exerceu primazia
jurídica sobre o Concílio de Éfeso. O argumento pode ser sumarizado
nos seguintes pontos:
(1) O concílio
de Éfeso (431) estava vinculado pela decisão do sínodo romano (430) que já havia excomungado Nestório.
Este
argumento é extremamente frágil, pois não faria qualquer sentido a convocação
de um concílio ecumênico para deliberar sobre algo já decidido de forma final
pela Igreja de Roma.
(2) Cirilo de
Alexandria – o grande oponente de Nestório – teria atuado como um legado de
Roma no concílio.
Este
argumento exagera sobre a atuação de Cirilo. Ele de fato representou os
interesses de Roma, mas, acima de tudo, estava representando os seus próprios
interesses. Toda a controvérsia envolvia o embate de duas escolas teológicas:
Antioquia e Alexandria. O primeiro a sistematicamente responder Nestório foi
Cirilo, só depois Roma entraria na disputa. Se Celestino tivesse
tomado o partido de Nestório e, diante disso, Cirilo tivesse retrocedido de sua
vigorosa posição em virtude somente da autoridade do papa, aí sim teríamos uma
evidência da primazia jurídica de Roma. Abaixo, vamos expandir e documentar os
contra-argumentos. Mas, antes, convém analisar a relação de Celestino com a
Igreja norte-africana.
J.N.D Kelly sobre Celestino, o Concílio de Éfeso a Igreja norte-africana
Nesta parte,
os apologistas católicos apresentam uma autoridade patrística em seu favor – o
anglicano J.N.D Kelly:
Em
sua correspondência e através de seus legados no Concílio Celestino
repetidamente afirmou, com uma insistência sem precedentes, a reivindicação do
papa, como sucessor e representante vivo de São Pedro, à supervisão paterna de
toda a Igreja, oriental e ocidental” (Oxford Dicionário do Papa, pág. 42).
Que os bispos
de Roma tentaram impor uma supremacia sobre a Igreja universal em algum momento
da história não é um ponto de discussão. A questão é se a Igreja Universal
aceitou tais imposições. Kelly afirma que se tratava de uma
“insistência sem precedentes”, ou seja, era em algum aspecto uma novidade. Ele afirma que
Celestino “condenou estas visões [de Nestório] num sínodo romano em 10 de
agosto de 430, e exigiu a retratação de Nestório dentro de 10 dias ou
enfrentaria a excomunhão” (p. 42).O imperador “Teodósio II convocou um concílio universal (o terceiro) a se encontrar em Éfeso em junho de 431 para resolver o caso” (p. 42). O erudito também menciona que “as atas do concílio não foram submetidas a Celestino” (p. 42). Dessa forma, Kelly está de acordo com a historiografia majoritária quando apresenta Celestino como alguém que possuía a ambição do primado jurídico, mas que de fato não o exerceu sobre a Igreja universal. Destaca-se que, a exemplo de Éfeso, nenhum dos sete primeiros concílios ecumênicos foi convocado pelo papa, mas pelo imperador. A mesma obra aponta os limites da jurisdição de Celestino, mesmo no ocidente:
Sua convicção [de Celestino] de que Roma poderia receber
apelos de qualquer província o colocou
em coalizão com a igreja norte-africana. Apesar de ele ter se rendido ao
apelo de Agostinho para não atender a demanda de reinstaurarão de Antônio de
Fussala – um bispo deposto que apelou para Bonifácio I, ele solicitou a reabilitação de Apiario, um sacerdote desonrado que
havia sido restaurado mediante o pedido de Zósimo, mas novamente caiu e foi
excomungado, e fora enviado de volta para África com um legado notoriamente
arrogante – Faustino. Um concílio plenário ocorreu em Cartago (426), no qual
Apiario desmoronou e admitiu sua culpa. Os
bispos africanos aproveitaram a oportunidade para lembrar ao papa a respeito de
sua tradicional autonomia, e o pressionaram para não entrar em comunhão com
pessoas que eles excomungaram. (Kelly, The
Oxford dictionary of popes, 3ª edição, p. 41)
A Igreja norte-africana lutou por
sua autonomia, e embora rendesse grande deferência à Igreja de Roma, não
aceitava sua jurisdição suprema neste período. O historiador ortodoxo A. Edward
Siecienski comenta o caso de Apiario:
Em 424, um padre africano de nome Apiario (nomeado “poço de
vícios” pelos seus acusadores), apelou a Roma após sua sentença de excomunhão,
mais uma vez levantando a espinhosa questão da habilidade do papa de se
envolver em questões puramente locais. Os ferozes e independentes bispos
africanos – significativamente sem a participação de Agostinho – escreveram
para Celestino, pedindo a ele para não “admitir em sua presença pessoas [como
Apiario] vindo de lá, nem deveria
aqueles que são do além-mar estarem dispostos, daqui em diante, a aceitar de
volta a comunhão aqueles que foram excomungados”, desde que isto era uma clara violação do cânon 5 de Niceia.
Numa carta na qual eles “nem mesmo tentaram esconder sua fúria", os bispos
sarcasticamente perguntaram a Celestino se “há alguém que acredita que nosso Deus escolheu dotar apenas uma pessoa
com o senso de justiça e negar isto ao incontável número de bispos reunidos num
concílio”. Apesar de eles “considerarem Roma como uma indispensável fonte
de conselho e julgamento”, os bispos
africanos agora rejeitam o papa em termos muito fortes. Eles haviam falado, a
questão estava encerrada. (The Papacy
and the Orthodox: Sources and History of a Debate, Oxford University Press, 2017,
p. 168)
Roma
encontrava resistência no ocidente, que dirá no oriente. É muito improvável que
um bispo que não tinha jurisdição total sobre sua área de influência pudesse
exercê-la sobre outras sedes
Cirilo de Alexandria, a deposição de João Crisóstomo e Roma
A apologética
católica cita a atuação de Cirilo como evidência do primado jurídico de Roma,
mas como já dito, Cirilo estava no mesmo time que Roma e não havia motivos para
não endossar a posição de Celestino, afinal era uma causa comum. Mas, será que
Cirilo estava disposto a seguir Roma quando as opiniões divergiam? Algumas
décadas antes do Concílio de Éfeso (431), a Igreja de Alexandria (da qual
Cirilo era assistente do patriarca) e a Igreja de Roma tomaram posições opostas
em relação à deposição de João Crisóstomo (então patriarca de Constantinopla).
O estudioso patrístico ortodoxo John McGuckin é autor da obra mais detalhada e
rica sobre Cirilo e a controvérsia cristológica. Ele escreveu:
No mesmo ano de 403, Cirilo atendeu juntamente com seu tio ao
Sínodo de Carvalho em Constantinopla, que depôs João Crisóstomo (...) Tendo
sido envolvido neste julgamento do grande João Crisóstomo, Cirilo permaneceu firme com seu tio na opinião que João havia sido
corretamente deposto, mesmo permitindo que a questão causasse um obscurecimento das relações entre a
Igreja Alexandrina e Roma, que demandava a reabilitação de João. As relações entre Roma e Alexandria
permaneceram pobres até os primeiros anos da administração de Cirilo. (St. Cyril of Alexandria The Christological Controversy: Its
History, Theology, and Texts, 3ª edition, 1994, p. 5)
McGuckin
menciona que Alexandria só entraria novamente em comunhão com Roma anos mais
tarde, sem qualquer retratação formal a respeito da deposição de João (p. 6). Este
episódio evidencia que a Igreja Alexandrina não via a posição de Roma como
vinculante por si mesma. Cirilo não estava disposto a mudar de ideia, mesmo
quando Roma estava no polo oposto. João Crisóstomo enviou cartas ao bispo de
Roma e outros bispos ocidentais para angariar apoio contra sua deposição. O
historiador da Igreja William Stephens escreveu:
O Patriarca da Roma Oriental apela aos grandes bispos do
Ocidente, como os defensores de uma disciplina eclesiástica que ele confessa
ser incapaz de impor, ou de ver qualquer perspectiva de se estabelecer. Nenhum
ciúme é entretido do Patriarca da Velha Roma pelo Patriarca da Nova Roma. A
interferência de Inocêncio é cortejada, uma certa primazia é concedida a ele,
mas ao mesmo tempo ele não é tratado
como um árbitro supremo. Ajuda e simpatia são solicitadas a ele como de um
irmão mais velho, e dois outros prelados
da Itália são destinatários conjuntos do apelo. (Saint Chrysostom: His Life and Times, Elibron Classics,
2005, p. 349–50)
O protesto de
Inocêncio se revelaria inútil. Ele chegou a enviar uma comissão de bispos
italianos para Constantinopla, mas que não conseguiram entrar na cidade (aqui).
Nestório e os limites da jurisdição de Roma
Nestório foi
patriarca de Constantinopla – a nova Roma – como o Concílio de Constantinopla I havia declarado à revelia do bispo romano. Este concílio ecumênico ocorreu sem o conhecimento do bispo de Roma. McGuckin
comenta:
O direito
canônico da Igreja de Constantinopla de atuar como suprema corte de apelo para
as igrejas orientais foi estabelecido pelos cânones do Concílio de
Constantinopla em 381. Desde o princípio, no entanto, Roma não esteve disposta a reconhecer a validade desses cânones
específicos. Não é simplesmente que Constantinopla havia assumido o segundo
lugar no ranking das sedes mais importantes, pois os vários rankings não foram estritamente hierárquicos em
qualquer estágio de funcionamento da pentarquia dos patriarcados – o que era na
verdade o alcance jurisdicional da sede da cidade imperial. Sua jurisdição estava já se estendendo
sobre os territórios da Ásia Menor e seu indisputável lugar como a capital do
mundo civilizado estava agora pressionando as cortes da igreja em
Constantinopla a assumir o papel de tribunal cristão de toda a comunidade (...)
(McGuckin, p. 34)
O cânon 3 do
referido concílio dizia:
O Bispo de Constantinopla, no entanto, terá a prerrogativa de honra depois do Bispo de Roma, porque
Constantinopla é a Nova Roma. (Cânon 3)
Constantinopla
foi fundada no séc. IV, portanto não poderia reclamar fundação apostólica.
Ainda assim, foi alçada a um posto acima de Alexandria, Antioquia e
Jerusalém, porque era a nova cidade imperial. Este cânon esclarece que o
primado de Roma era de honra e não jurídico. Constantinopla passou a exercer a
função de corte de apelo supremo no oriente. McGuckin prossegue:
Alexandria compartilhava da aversão de Roma à ascensão de uma
nova estrela no firmamento eclesiástico, como também fez Éfeso, a capital
metropolitana da província da Ásia, cujos bispos viram seu prestígio diminuir
enquanto o da sé imperial aumentava. O caso da deposição de João Crisóstomo, a
partir do jovem Cirilo, mostra quão atual toda questão era. Crisóstomo havia aplicado os cânones de
Constantinopla rigorosamente numa campanha desenhada para trazer as igrejas da
Ásia Menor mais diretamente para seu controle. (McGuckin, p. 35)
E mais sobre
o Concílio de Constantinopla:
Roma nunca
havia aceitado a validade dos cânones conciliares de 381 que tiraram Alexandria
da hierarquia de prestígio e colocaram Constantinopla no seu lugar com iguais
privilégios aos da Velha Roma. O cânon
tinha a força da lei imperial, e no Oriente, onde os decretos conciliares
teológicos nunca foram compreendidos como separados dos cânones a qual estavam
ligados, este modo eclesiástico de governo eventualmente foi aceito como um fato da vida (...) Roma estava remando contra a maré, em certo sentido, ao
recusar o reconhecimento dos cânones de Constantinopla, e a mesma política foi repetida depois como uma resposta imediata
quando o Concílio de Calcedônia (451) reafirmou os decretos de 381. (McGuckin, p. 72)
Nestório,
que, décadas depois, ocuparia a cadeira de Crisóstomo, prosseguiria com o mesmo
tipo de política:
O que Nestório estava fazendo, ao adjudicar estes casos
relacionados a Roma e Alexandria, era cuidadosamente enviar sinais claros para
seus colegas bispos que Constantinopla
estava pronta para assumir o papel de corte final de apelo no mundo cristão em
matéria de disciplina, mas também, implicitamente, em questões doutrinais. (McGuckin, p. 35)
Os casos referidos são a iniciativa de rever a deposição de bispos feitas por Cirilo em Alexandria (p. 34) e a abertura de uma
comissão para analisar o caso de pelagianos excomungados pelo bispo de Roma (p.
35). Nestório enviara duas cartas a Celestino solicitando informações sobre o
processo sinodal que depusera os pelagianos, deixando claro que a decisão de
Roma não era final, ainda que a controvérsia pelagiana não fosse uma questão
que afetasse ou interessasse a Igreja Oriental (p. 37). O caso dos monges
depostos por Nestório também expressa a inexistência de uma jurisdição romana
efetiva no Oriente:
(...) Nestório seguiu o sinal dado no sermão de Doroteu e
começou a ameaçar seus dissidentes em Constantinopla como hereges pertinazes.
Ele depôs vários dos líderes monásticos agitadores, que inevitavelmente apelaram ao Imperador contra ele, demandando que um
concílio ecumênico revisasse o caso. Foi a
primeira vez que a ideia foi mencionada, e parece ter ecoado na cabeça do Imperador
como uma forma possível de sair de uma crescente e intratável controvérsia. (McGuckin, p. 38)
Os monges nem
cogitaram levar o caso a Roma, mas apelaram ao imperador. É comum que os
apologistas tomem qualquer apelo ao bispo de Roma como evidência do primado
jurídico. O caso acima demonstra como este argumento é indevido. Apesar de
apelarem ao imperador, este atribuiria ao concílio ecumênico o papel de investigar a questão. Isto
foi antes de qualquer decisão do sínodo romano. Resta claro que uma decisão de
Roma não poderia encerrar esta controvérsia.
Um sínodo universal seria necessário. Os monges pediram o que de fato iria
ocorrer em 431.
O concílio de Sardica, o bispo de Roma Júlio e
Atanásio (342)
Este
concílio foi citado superficialmente pelo apologista Ybarra. Apesar de não estar diretamente relacionado à Éfeso, é importante respondê-lo. Eu já
tratei em detalhes do tema (aqui). O concílio de Niceia I (325) estabeleceu que os
bispos deveriam se reunir em sínodos semestrais dentro de cada província para
atuarem como um tribunal de segunda instância e rever casos em que sentenças de
excomunhão foram proferidas por bispos individuais. Mesmo após o partido de
Atanásio ter saído vencedor em Niceia, os arianos com o apoio do imperador
continuaram a ocupar boa parte dos cargos no oriente e excomungaram Atanásio no
sínodo de Tiro (335). Diante da falta de apoio no oriente, Atanásio apelou ao
bispo de Roma – Júlio I – que por sua vez convocou os bispos orientais para um
sínodo em Roma, com a intenção de rever a sentença de Tiro. Os bispos orientais
recusaram a revisão da sentença de tiro e formularam um novo credo num sínodo
em Antioquia (341). Diante da controvérsia, em que sínodos regionais tomavam
decisões contraditórias, um grupo de bispos orientais com o apoio do imperador
e do bispo de Roma fizeram convocar um concílio pretensamente ecumênico em
Sardica. Este é resumidamente o contexto histórico. O historiador católico Klaus Schatz comenta:
De
acordo com a concepção da Igreja primitiva, o sínodo de bispos vizinhos era o
tribunal imediatamente superior que poderia proceder à destituição de um bispo. Mas desta
vez se tratava de um conflito em que tal instituição não poderia resolver, pois
outros sínodos, e de maneira especial o realizado em Roma (341), onde os bispos
depostos pediram ajuda, especialmente Atanásio, deu razão aos partidários
deste. O problema surgia nestes termos: o que fazer quando um sínodo anula o que
outro determinou? Nesta inda e vinda, surgiram várias posições. Os bispos
orientais, no sínodo de Antioquia (341), defenderam
o princípio da autonomia de cada sínodo, segundo o qual a sentença de Tiro é
definitiva e não poderia ser anulada: um bispo ou presbítero julgado por um
sínodo não poderia apelar para outro. Em última consequência, essa posição
significava a autonomia de cada igreja individual e, para fins práticos, o
princípio da igreja imperial sob o imperador. Frente esta opinião, a postura romana postulava uma hierarquia
de sínodos: nem todos os sínodos
tinham o mesmo valor; os pequenos poderiam ser anulados pelos maiores (...) (Papal Primacy: From Its Origins to the Present. Collegeville, Minnesota:
Liturgical Press, 1996, p. 50)
Observem
que o concílio ecumênico de Niceia estabeleceu uma prática que dava aos sínodos
regionais a palavra final na questão da excomunhão. No entanto, quando sínodos
regionais diferentes (como Roma e Tiro) contradiziam um ao outro, qual seria a
instância de decisão? Esta instância não existia ainda, o que evidencia a
ausência do papado neste período. O apologista católico Ybarra disse:
Há
a situação de Atanásio e outros bispos orientais que foram restaurados às suas
vistas pelo papa São Júlio, revertendo efetivamente o sínodo provincial
oriental de Tiro (335).
Não foi o que
ocorreu. Os bispos orientais não aceitaram os pedidos de Júlio e defenderam a
autonomia dos sínodos regionais. Foi necessário um concílio pretensamente ecumênico (Sardica) para reverter as
decisões de Tiro. Ora, se o bispo de Roma não conseguiu reverter as decisões de um sínodo regional, e um concílio
ecumênico precisou ser convocado para tal, qual a implicação? Um concílio que
se pretendia ecumênico tinha autoridade superior ao bispo de Roma. Schatz prossegue:
A posição do bispo Júlio, defendendo a coparticipação da
Igreja universal, resultou num concílio
universal na linha de Niceia, convocado pelos dois imperadores em Sardica, a
atual Sofia (342). Os bispos orientais, anti-atanasianos, exigiram primeiro
que Atanásio e os outros bispos não pudessem participar - uma reivindicação que
foi rejeitada. Antes de tudo, eles
defenderam a ideia da autonomia do Oriente e Ocidente: o Ocidente não deve se
intrometer em controvérsias do Oriente e vice-versa. Finalmente, eles se separaram com o pretexto de que
tinham recebido a notícia de uma vitória do imperador oriental sobre os persas,
triunfo que deveria ser comemorado com suas comunidades. O Ocidente seguiu reunido por conta própria.
Tendo em vista a incapacidade dos sínodos em acabar com os conflitos eclesiais,
essas deliberações levaram à primeira tentativa de definir juridicamente a
responsabilidade de Roma na "comunhão" dos bispos. Pela proposta do
bispo espanhol Osio de Córdoba, se
decidiu que os bispos demitidos por um sínodo poderiam apelar ao bispo de Roma.
Se o bispo romano verificasse que a sentença proferida não tinha sido justa,
então ele pediria uma nova apreciação do caso pelos bispos da província vizinha
e na presença dos presbíteros romanos, se assim desejasse o réu, e este sínodo
deveria examinar o caso novamente. Em sentido estrito, Roma não é sequer uma instância de apelação. Não é o bispo romano que
julga o caso. O seu papel se reduz a uma instância de revisão que deve garantir
que o recurso (para outro sínodo) seja iniciado. (Schatz, p. 51)
O apologista
católico Ybarra afirmou sobre Sardica:
Depois,
há o Concílio de Sárdica (343), que colocou em forma canônica o processo de
apelos à Sé de Pedro, onde bispos condenados poderiam ter seu caso repetido
(meramente carimbando o que o Papa fez com Santo Atanásio).
Observa-se
que os orientais abandonaram o concílio. Por isso, ele não é considerado
ecumênico. Desta forma, apenas os ocidentais permaneceram e aprovaram uma
fórmula que sequer colocava Roma como instância de apelação. O papel do Bispo
de Roma seria garantir que outro sínodo regional examinasse a decisão do
primeiro. Ainda, o concílio não meramente carimbou o que o papa fez, mas
estabeleceu um sistema de recursos em que um sínodo regional continuava a ser
instância final de julgamento no caso das excomunhões. Schatz prossegue:
A resolução de Sardica não
se impôs de imediato no Ocidente, muito
menos no Oriente. Os cânones de Sardica, que no início do século V são publicados em Roma falsamente como
"nicenos" são a primeira célula germinal de um longo processo
evolutivo que duraria quase um milênio. Esse processo é concluído por volta de
1200, sob Inocêncio III, no sentido de atribuir a Roma a competência exclusiva
para as "causas maiores", isto é, para tudo que envolvesse bispos ou
dioceses (demissão, transferência para outra diocese ou renúncia ao cargo). (Schatz, p. 55)
Por razões
óbvias, o Oriente não aceitou os cânones de Sardica. A respeito da resistência
no Ocidente, vimos o caso da Igreja norte-africana, que no séc. V, determinaria
que os apelos não deveriam ser encaminhados à Roma. Neste momento, se verifica
o primeiro caso de um artifício que Roma usaria com frequência nos séculos
seguintes: o uso de falsificações. Robert Eno comenta:
Roma
apresentou um dos cânones de Sardica como um cânone de Niceia. Os bispos africanos
disseram corretamente que não encontraram tal cânon em seus registros (...) Em
Roma, os cânones de Sardica foram assimilados aos cânones de Niceia (uma afirmação que continuou a ser feita
mesmo depois da correção africana!) (Doctrinal
Authority In Saint Augustine, Augustinian Studies, Vol. 12 - 1981, pp. 162)
Schatz ainda
comenta como terminou a controvérsia:
Ao longo de sua expansão, o conflito ariano se apresenta como
um debate em que Roma não consegue impor
seu ponto de vista, nem mesmo tenta dar um golpe enérgico ao processo de
evolução que se aparta de Niceia. Os bispos romanos Júlio e, inicialmente, o
seu sucessor Liberio (352-366) pertencem ao grupo dos que permanecem fiéis a
Atanásio. No longo prazo, esta postura ajudou a fortalecer a autoridade de
Roma, e especialmente no Oriente; mas
não se pode falar de uma imposição da própria vontade. A igreja romana
também teve seu momento de debilidade. O bispo Liberio, sob pressão imperial, foi enviado ao exílio, separado de sua comunidade e em Roma foi nomeado um
anti-bispo. Ele ainda deu aprovação a uma
fórmula de fé, que se não nega especificamente a fórmula nicena, prescinde dela
e na prática a abandona. Assim
rompia a comunhão eclesial com Atanásio.
(Schatz, p. 56)
Em suma, o
que esta controvérsia do séc. IV evidencia é que o bispo de Roma exercia uma
autoridade bastante limitada, que não poderia nem de longe ser a de um bispo
que tinha primazia jurídica sobre a igreja universal.
O apelo de Cirilo ao bispo de Roma
Em 430, após
escrever cartas condenando a doutrina de Nestório, Cirilo apela ao bispo de
Roma a fim de angariar apoio a sua causa. Este apelo é então apontado pelos
apologistas como evidência do papado. Tal técnica argumentativa é muito
aplicada aos pais da Igreja, contudo parte de uma premissa falaciosa. Cirilo
era o bispo de Alexandria – seu oponente Nestório era bispo de Constantinopla e o bispo
de Antioquia (João) era mais simpático a Nestório. Além disso, o imperador, que
tinha uma autoridade importante sobre os assuntos da Igreja, também nutria
simpatia por Nestório. Obviamente, Cirilo apelaria a Roma, afinal, diante de
tantos oponentes poderosos no Oriente, o apoio de Roma seria de grande ajuda. Cirilo estava consciente da antipatia de Roma por Nestório, já que
ele ofereceu certo apoio aos pelagianos – um grupo que Celestino intentava
eliminar.
Se os apologistas
católicos realmente desejam defender a supremacia papal nestas controvérsias, é preciso demonstrar que as Igrejas Orientais retrocederam de posições
teológicas com base somente na autoridade de Roma para definir a posição ortodoxa. Contudo, os concílios ecumênicos mostram
exatamente o oposto. Reiteradas vezes o bispo de Roma teve que aceitar decisões
conciliares contra sua vontade. Ainda, em toda a controvérsia, o patriarcado de
Antioquia tomou o partido de Nestório, tendo seu bispo João até mesmo
instaurando um concílio paralelo durante o concílio de Éfeso. Dessa forma, como o primado universal pode
ser defendido quando uma parte significante da Igreja resistiu à condenação de
Nestório pela igreja romana? Philip Schaff escreveu:
Cirilo primeiro escreveu para Nestório; depois, para o imperador, a imperatriz Eudokia e a irmã do imperador
Pulquéria, que se interessavam intensamente pelos assuntos da igreja, e
finalmente ao bispo romano Celestino. Ele [Cirilo] advertiu bispos e
igrejas do leste e do oeste contra as perigosas heresias de seu rival.
Celestino, movido pelo instinto ortodoxo, lisonjeado pelo apelo à sua
autoridade, e indignado pela acolhida amigável de Nestório aos pelagianos
exilados, condenou sua doutrina em um concílio romano e o demitiu da cadeira
patriarcal, a menos que ele se retratasse dentro de dez dias (430). Como Nestório persistiu em sua opinião,
Cirilo, desprezando a mediação amigável
do patriarca João de Antioquia, lançou doze anátemas ou fórmulas de
condenação contra o patriarca de Constantinopla a partir de um concílio em
Alexandria por pedido do papa (430). Nestório respondeu com doze contra
anátemas, nos quais acusou seus oponentes da heresia de Apolinário. Teodoreto de Ciro, o expositor erudito e
historiador da igreja, também escreveu contra Cirilo a pedido de João de
Antioquia. A controvérsia tornou-se tão geral e crítica que só poderia ser resolvida por um
concílio ecumênico. (Fonte)
Observem que
Cirilo não apelou apenas ao bispo de Roma, mas também ao imperador. O alexandrino também se comunicou com monges
do Egito e outros bispos. Ele encaminhou uma carta ao bispo Acácio que era muito
respeitado no Oriente (aqui). O epistolário de Cirilo pode ser visto aqui. Esta
carta é importante porque nela é defendida a realização de um sínodo no Oriente para
condenar as teses de Nestório. Porém, o bispo Acácio teria uma postura mais simpática
a Nestório e, ao responder Cirilo, não apoiaria a iniciativa. Se
Cirilo considerasse o bispo Romano o árbitro final em questões de doutrina,
este apelo a múltiplos bispos e a necessidade de sínodos tanto no Oriente como
Ocidente seria inexplicável. O bispo de Roma decretou uma sentença de
excomunhão para Nestório a menos que ele se retratasse em 10 dias. Ocorre que o
tempo passou, Nestório não se retratou e ele não foi excomungado. A excomunhão
só ocorreria de fato com as decisões do Concílio de Éfeso. O apologista Ybarra traz a citação da
carta de Cirilo a Celestino:
“Cirilo envia saudações …
Seria mais agradável se pudéssemos ficar calados, mas Deus exige de nós
vigilância, e o antigo costume da igreja
requer que eu informe a sua santidade … Eu até agora observei um profundo
silêncio … Não estava disposto a cortar
abertamente a comunhão com ele até que eu colocasse esses fatos diante de você.
Buscando decidir o que parece certo, se deveríamos comungar com ele, ou para
dizer claramente que ninguém deve comungar com uma pessoa que mantém e ensina o
que ele ensina, o propósito de sua santidade deve ser conhecido por carta aos
Bispos mais religiosos e amantes de Deus da Macedônia, e a todos os Bispos do
Oriente, pois então os daremos de acordo com seu desejo, a oportunidade de se
unir em unidade de alma e mente, e
levá-los a lutar fervorosamente pela fé ortodoxa que está sendo atacada “ (São
Cirilo ao Papa São Celestino, PL 77.80)
E comenta:
Em todo caso, parece
bem estabelecido por sua época que Roma é o árbitro final de todo e qualquer
caso disciplinar e mesmo doutrinário, e ele simplesmente sentiu a obrigação de
agir de acordo.
A conclusão acima não segue de
nenhum trecho da citação. Não há absolutamente nada na carta que implique a
crença de que o bispo romano era o árbitro final de questões disciplinares ou
doutrinárias. É evidente que Cirilo já considerava Nestório um herege antes de
escrever para Roma e ninguém em sã consciência diria que ele mudaria de opinião
caso Roma decidisse a favor de Nestório. Ele já estava consciente da antipatia
de Roma por Nestório, bem como da incompatibilidade da fé defendida por Roma
com a cristologia nestoriana. A carta apenas expressa o desejo de Cirilo ter o apoio do patriarcado de Roma. Além disso, há outro problema
grave na citação. A fonte citada pelo apologista é um antigo livro apologético
em favor do papado (aqui). A principal tradução para o inglês das cartas de Cirilo traz palavras diferentes (aqui). Ao
invés de “o antigo costume da igreja requer que eu informe a sua santidade”, ela traz:
Eu
diria para mim mesmo que o silêncio é bom e sem raiva, e descansar é melhor do que
se envolver na turbulência. Mas, desde
que Deus nos demanda cautela nestes assuntos, e o antigo costume da Igreja
persuade-me a comunicar com vossa santidade, eu escrevo sobre a necessidade
de revelar isto: satanás está agora mesmo tentando virar tudo às avessas,
atacando as Igrejas de Deus, e tenta perverter a fé do povo em todos os lugares
que estão caminhando seriamente na fé.
A citação
anterior dá a ideia de obrigação, enquanto esta transmite a ideia de opção.
Cirilo foi persuadido, ou seja, convencido pelo antigo costume. Ele não está
obrigado por nenhuma lei canônica, mas lhe pareceu
bom se comunicar com Roma. As razões para isto não são a autoridade suprema de
Roma, mas o fato de que a fé verdadeira estava sendo corrompida. Não obstante,
ele não escreveu apenas para Roma, mas para todos aqueles dispostos a apoiá-lo
no que acreditava ser a defesa da fé ortodoxa. Mas, que antigo costume era
este? Nada mais do que o costume de diferentes partidos de uma controvérsia
buscarem apoio em outras Igrejas, e, obviamente, Roma era um importante apoio
a ser alcançado. Atanásio apelou a Roma (mais detalhes abaixo) e outros bispos, assim como Crisóstomo, fizeram o mesmo. Em nenhum desses casos, a decisão de Roma foi final. McGuckin comenta:
Em 441 João de Antioquia morreu e foi substituído por seu sobrinho Domno. Cirilo escreveu para o novo patriarca em duas ocasiões. A primeira ocasião foi para interceder por um um certo bispo - Atanásio de Perra - que havia sido deposto de sua Igreja, a pedido do clero num sínodo metropolitano na Síria, e que havia apelado desta decisão a Cirilo. Ele foi algumas vezes acusado de interferir na jurisdição de Domno, mas o apelo a bispos de eminentes sedes era um costume já estabelecido. (p. 122)
Não apenas Roma era alvo deste tipo de apelo, e não havia nestes pedidos qualquer relação de jurisdição. Como neste caso, Cirilo apenas pediu que um novo julgamento fosse realizado e não poderia anular por sua própria autoridade a decisão do outro sínodo. O mesmo se aplica a Roma. Não havia qualquer relação de jurisdição em vista.
É importante notar que neste período Cirilo já havia firmado sua posição e escrito as cartas para Nestório. Ele não consultou Roma para só depois decidir o que fazer. Ele se comunicou com o bispo romano para angariar apoio ao que já tinha feito. Cirilo menciona na carta a Celestino que Nestório afirmou coisas que estavam “longe da fé dos Apóstolos e dos Evangelhos que os pais haviam protegido e transmitido a nós”. Sua convicção já estava formada. Além do antigo costume, Cirilo cita a “cautela” como causa para escrever para Roma. Se, como ele pensava, a doutrina de Nestório blasfemava a Cristo, era natural ter o apoio desta importante parte da Igreja. Ele também afirmou que os bispos Orientais estavam de acordo com ele, o que era um exagero, pois Nestório tinha a simpatia de importantes setores da igreja Oriental. Outro trecho relevante:
Em 441 João de Antioquia morreu e foi substituído por seu sobrinho Domno. Cirilo escreveu para o novo patriarca em duas ocasiões. A primeira ocasião foi para interceder por um um certo bispo - Atanásio de Perra - que havia sido deposto de sua Igreja, a pedido do clero num sínodo metropolitano na Síria, e que havia apelado desta decisão a Cirilo. Ele foi algumas vezes acusado de interferir na jurisdição de Domno, mas o apelo a bispos de eminentes sedes era um costume já estabelecido. (p. 122)
Não apenas Roma era alvo deste tipo de apelo, e não havia nestes pedidos qualquer relação de jurisdição. Como neste caso, Cirilo apenas pediu que um novo julgamento fosse realizado e não poderia anular por sua própria autoridade a decisão do outro sínodo. O mesmo se aplica a Roma. Não havia qualquer relação de jurisdição em vista.
É importante notar que neste período Cirilo já havia firmado sua posição e escrito as cartas para Nestório. Ele não consultou Roma para só depois decidir o que fazer. Ele se comunicou com o bispo romano para angariar apoio ao que já tinha feito. Cirilo menciona na carta a Celestino que Nestório afirmou coisas que estavam “longe da fé dos Apóstolos e dos Evangelhos que os pais haviam protegido e transmitido a nós”. Sua convicção já estava formada. Além do antigo costume, Cirilo cita a “cautela” como causa para escrever para Roma. Se, como ele pensava, a doutrina de Nestório blasfemava a Cristo, era natural ter o apoio desta importante parte da Igreja. Ele também afirmou que os bispos Orientais estavam de acordo com ele, o que era um exagero, pois Nestório tinha a simpatia de importantes setores da igreja Oriental. Outro trecho relevante:
Mas nós não cortamos a comunhão
com ele abertamente, até
termos comunicado estas questões a vossa reverência. Portanto é digno
especificar o que é melhor, e se é necessário estar em comunhão com ele as
vezes, ou proibir daqui em diante abertamente
porque ninguém está em comunhão com alguém que pensa e ensina tais coisas.
É necessário que a intenção de vossa reverência nesta questão se torne clara
por meio de uma carta aos muito amados e devotos bispos de Deus na Macedônia e
para aqueles no Oriente, pois nós demos a eles, como desejavam, os meios
para estarem numa só mente e opinião, e defenderem a verdadeira fé que está
sendo atacada.
Antes de cortar a comunhão com
Nestório, Cirilo deseja robustecer seu caso com o apoio de Roma. Eles ainda não
haviam cortado a comunhão oficialmente, mas já a tinham cortado de fato. Os
bispos já não estavam em comunhão com Nestorio. O resultado de tudo isto foi a
convocação de um sínodo em Roma que decretou a excomunhão de Nestorio em 10
dias a menos que houvesse retratação. Contudo, mesmo depois do sínodo em Roma,
outro sínodo em Alexandria presidido por Cirilo trouxe uma condenação mais
ampla a Nestório. A questão que se
coloca é porque um sínodo no Oriente era necessário, se a decisão do bispo de
Roma já era vinculante para toda a Igreja? A explicação é que a decisão de Roma
era apenas de Roma. Apesar de robustecer o caso contra Nestório, era necessário
que o Oriente fosse da mesma opinião, pois Roma sozinha não poderia definir os
rumos da controvérsia. McGuckin escreveu:
Quando
o veredicto romano foi comunicado a Alexandria, foi a ocasião para Cirilo convocar seu próprio sínodo de bispos
egípcios. Eles formalmente repetiram, em novembro do mesmo ano, a
condenação da doutrina de Nestório, e apesar de a carta sinodal romana não ter
feito uma exposição cristológica, Cirilo
remediou o defeito e assegurou que sua própria Igreja iria fornecer uma. (McGuckin,
p. 44)
Cirilo exagerou quando relatou
a postura do Oriente contra Nestório, tanto é que dois sínodos, um ocidental e
outro oriental, não foram suficientes para definir a questão e um concílio
universal precisou ser convocado. McGuckin
comentou a respeito do sínodo romano:
Apesar da esperança romana de que sua palavra seria
suficiente, esta maneira de resolver
desacordos doutrinais nunca foi o procedimento canônico das Igrejas Orientais,
que desde os tempos mais antigos seguiram o processo sinodal, não permitindo direitos monárquicos de
governo a nenhum bispo supremo (89). Imediatamente após o recebimento da
carta do papa em Constantinopla, o Imperador resolveu tomar seu próprio curso
de ação. Sua Sede Capital precisava ser salva da humilhação pública e, em
novembro de 430, ele assinou sua concordância final com o propósito de um
sínodo ecumênico para considerar toda a questão desde o início. Nos olhos da corte, este encontro ecumênico
iria superar, de direito, os decretos sinodais romanos, ou aqueles de qualquer
Igreja Local. (McGuckin, p. 43-44)
Alguém
poderia objetar que a opinião do Imperador não era relevante para as
controvérsias, mas isto revela um desconhecimento do contexto histórico. Neste
período, o Imperador tinha o direito de convocar os concílios, assim como
deveria ratificar suas decisões. Ele era o guardião das leis canônicas, mas
também tinha certa influência nas disputas doutrinárias. Estas eram as funções
que séculos depois seriam reclamadas pelos bispos de Roma, mas neste período,
eram exercidas pelo imperador. O estudioso prossegue:
Desde o tempo de Constantinopla I, os bispos orientais haviam
aplicado o processo sinodal, apelando às
grandes sedes metropolitanas, e dirigindo petições direto aos imperadores,
tudo como métodos legítimos de assegurar a política religiosa. (Nota de rodapé
n. 89)
Roma não era
uma corte de apelo canonicamente reconhecida pelas Igrejas Orientais. Ele
também afirma:
No século quinto, a
única parte que sustentou esta perspectiva [do primado papal] na questão foi a
própria representação romana. (McGuckin, p.
43, nota de rodapé n. 88)
Após a
convocação do Concílio, na primavera de 431, Cirilo escreveu outra carta para
Celestino questionando se a condenação de Nestório estava mantida. Os
apologistas católicos viram aí mais uma evidência do primado papal. Contudo,
McGuckin explica porque esta questão era importante:
(...) Na primavera de 431, ele certamente não
sentia que tal admissão [a cristologia de Cirilo] havia sido claramente adotada nem por Nestório nem pelos teólogos
orientais. Provavelmente, num crescente estado de alarme, ele escreveu para
o Papa Celestino, de alguma forma desesperado, para perguntar se as mútuas
condenações sinodais de Nestório continuavam de pé, apesar da convocação do
imperador para um sínodo ecumênico. Se o papa apoiasse a ele, Cirilo teria o direito canônico de insistir
que Nestório não aparecesse no Sínodo de Éfeso, exceto como réu. Isto não
iria apenas assegurar seu próprio caso, ao menos simbolicamente, no advento do
concílio, mas iria também evitar que
Nestório levantasse qualquer acusação canônica contra Cirilo. Alguém
formalmente acusado não poderia legalmente impedir seu acusador de julgar no
mesmo tribunal. (McGuckin, p. 50)
A questão era
toda sobre direito canônico. Como Nestório havia sido condenado num sínodo que
não estava sob a liderança de Cirilo, ele não poderia participar do julgamento
e nem poderia acusar Cirilo. Isto era relevante porque vários teólogos da
escola antioquena acusavam Cirilo da heresia apolinarista. Além disso, Cirilo
poderia ao mesmo tempo ser juiz e promotor no sínodo, o que de fato ocorreu.
Cirilo acusou, presidiu e julgou Nestório:
Era claro, em face da eminência do sínodo ecumênico, de que a mais alta corte eclesiástica iria,
de direito, ser capaz de revisar e reconsiderar todas as questões outra vez,
apesar de Roma e Alexandria poderem ter protestado e afirmado que a questão
já havia sido finalmente decidida. Papa
Celestino parece não ter tido ilusões neste ponto. Enquanto a carta de
Cirilo para ele não sobreviveu, a resposta do Papa, em 7 de maio de 431,
sobreviveu, e nela ele aconselha a respeito da necessidade de moderação e
discrição, caso contrário, Nestório
poderia se recuperar. (McGuckin, p. 51)
Até mesmo Celestino
estava consciente de que o caso iria ser reaberto, e Nestório poderia ganhar.
Consciente da possibilidade de derrota, Celestino preparou uma carta a ser enviado
ao imperador:
A carta selada era outra indicação da política de
distanciamento de Celestino. Se Cirilo ganhasse o dia em Éfeso, os legados
papais foram instruídos a viajar com ele para Constantinopla e apresentar a
carta secreta ao imperador. Nesta, o
papa insistia no direito dos bispos de determinar a verdadeira fé, e pedia que
o imperador sancionasse o que o concílio havia decidido, e aquilo que ele
já havia antes decidido na questão. Por outro lado, se Cirilo perdesse, os legados papais deveriam permanecer com ele em Éfeso
e reconsiderar a posição após consulta.
(McGuckin, p. 51)
O papa não
estava seguro quanto às decisões do concílio e precisaria pedir a sanção do
imperador caso seu partido vencesse. O concílio só poderia ser iniciado depois
da leitura da Sacra do imperador. Os
sírios, por receberem tardiamente a convocação do imperador, iriam organizar seu
próprio sínodo para discutir a questão (p. 54). Isto evidencia que para eles a
questão não estava encerrada. De fato, eles tomaram a posição contrária a
cristologia de Cirilo. Os opositores mais aguerridos de Cirilo eram os sírios Teodoreto e André de
Samosata.
O Concílio de Éfeso – Uma deliberação de fato
e não apenas um teatro
A parte mais frágil do
argumento católico é afirmar que um concílio universal foi convocado, tendo que
para isso mobilizar toda a Igreja, inclusive fazendo com que bispos idosos
viajassem milhares de quilômetros, só para reiterar aquilo que o bispo de Roma
já havia decidido. O fato histórico é que o concílio deliberou de fato sobre
Nestório, apesar de o próprio e alguns de seus defensores não terem
participado das reuniões. O concílio foi iniciado antes da chegada de João – o
patriarca de Antioquia – e outros membros de sua comitiva. Por esta razão, até
hoje é objeto de grande controvérsia a ecumenicidade de Éfeso, mas isto ficará
para outro artigo. O arcebispo católico romano Henri Charles Maret escreveu:
O
papa havia pronunciado no caso de Nestório um julgamento canônico vestido com
toda a autoridade de sua sé. Ele havia prescrito sua execução. No entanto, três meses após esta sentença e antes de
sua execução, todo o episcopado é convidado a examinar novamente e decidir
livremente a questão em disputa. (Du Concile General, vol. I,
p.183)
O apologista
traz a citação de Felipe, que era o legado do bispo romano no concílio de
Éfeso, no qual Celestino afirma que já havia julgado a causa em análise:
“Filipe,
o presbítero e legado da Sé Apostólica, disse: Abençoamos a santa e adorável
Trindade que nossa humildade foi considerada digna de participar de seu Santo
Sínodo. Há muito tempo atrás ( πάλαι ) nosso mais sagrado e abençoado papa
Cœlestino, bispo da Sé Apostólica, através de suas cartas àquele homem Santo e
mais piedoso, Cirilo, bispo de Alexandria, julgou a causa e o caso atuais ( ὥρισεν
) que cartas foram mostradas a sua santa assembléia. E agora, novamente, para a
corroboração da fé católica (καθολικῆς ), ele enviou através de nós cartas para
todas as suas santidades, as quais você irá oferecer ( κελούσατε ) para serem
lidas com reverência (πρεπόντως) e ser inscrito nas atas eclesiásticas .” –
Todas as citações das sessões do Conselho são extraídas do NewAdvent; Grifo
nosso
Estas
palavras são do representante de Roma que obviamente iria defender a causa
papal e não faz parte das decisões do Concílio. Ou seja, é basicamente a
opinião de Roma sobre si mesma e não a opinião do concílio sobre Roma. As atas
do concílio não foram preservadas integralmente, de forma que, da segunda
sessão, temos apenas extratos (aqui). Na fonte citada, Schaff comenta nas notas de rodapé,
referindo-se a uma das falas de Felipe:
Isto
parece-me ser o clímax de afirmações improváveis. Há muitas outras coisas
que induzirão o leitor curioso a suspeitar que os Atos não estão em boa forma.
Pairam
dúvidas sobre a confiabilidade dos extratos que sobreviveram. A carta de
Celestino enviada ao Concílio (aqui) não afirma que os bispos deveriam seguir suas decisões
porque sua autoridade era final e inquestionável, mas porque as decisões da sé
romana refletiam a doutrina apostólica. Ao menos neste documento, Celestino não
parece ter feito do primado papal o argumento mais importante. Obviamente, ele
estava consciente de que o concílio iria analisar a questão e não apenas
replicar a decisão de Roma. Por isso, neste documento, seu tom é mais ameno e
apela mais ao convencimento do que à autoridade. Celestino disse para os bispos
do concílio: “Pois esta não é a primeira vez que os campos eclesiásticos
recebem vocês como seus governantes”.
O apologista católico Ybarra cita estre trecho da carta:
(...) nós enviamos nossos santos irmãos e companheiros
sacerdotes, que são unos conosco e são os homens mais aprovados, Arcedio e
Projecto, os bispos, e nosso presbítero, Filipe, para que possam estar
presentes naquilo que é feito e possam
defender aquilo que já foi decretado por nós.
Que os
legados papais estavam no concílio para defender a posição de Roma, não há
dúvida. Agora, a conclusão de que o papa estava afirmando que a questão já
havia sido de direito definitivamente decidida é falaciosa e não pode ser
inferida do trecho acima. Na verdade, todo o processo implica o oposto.
Celestino precisava convencer o concílio a respeito da justiça de sua posição.
Se o Oriente considerava a decisão romana final, a própria convocação do
concílio seria desnecessária. O concílio só existiu justamente porque o sínodo
romano não teve autoridade para decidir definitivamente a questão. Ainda na
segunda sessão (aqui), Projecto – outro legado de Celestino – escreveu:
Que vossa Santidade considere a forma das cartas do santo e venerável Papa Celestino, o Bispo, que
exortou a sua Santidade, não como instruindo aqueles que são ignorantes, mas
como lembrando aqueles que estão conscientes: para que vocês possam comandar para que seja completamente
e finalmente estabelecido de acordo com o Cânon de nossa fé comum, e a
utilidade da Igreja Católica, o que ele determinou antes e tem agora a bondade
de lembrá-los.
Se o concilio
deveria comandar para ser “completamente e finalmente estabelecido”, a implicação é que a
decisão do concílio tinha mais autoridade. O católico galicano Jacques Bossuet comenta:
Esta é a vantagem de um concílio. Depois deste tipo de
sentença não há nova discussão ou novo julgamento, mas apenas execução. E isso
os legados pedem para ser comandados pelo concílio, no qual eles reconhecem essa autoridade suprema. (Fonte)
Bossuet também comenta sobre a
atitude de Cirilo e a deliberação do concílio:
E
há aqueles que dizem que as questões concernentes à fé, uma vez julgadas pelo
pontífice romano debaixo de sua autoridade apostólica são examinadas em concílios gerais a fim de entender seu conteúdo, mas
não para decidir sobre sua substância, como sendo ainda uma matéria de debate?
Deixe-os ouvir Cirilo - o presidente do concílio - que eles atendam ao que ele
propõe para a investigação do concílio. Embora ele não estivesse consciente de
nenhum erro, ainda, para não confiar em si mesmo, pediu a sentença do concílio com estas palavras “se escrevi
corretamente e sem culpa ou não”. Este Cirilo, o chefe do concílio propõe a deliberação. Quem já ouviu
que, depois de um julgamento final e irreversível da Igreja sobre uma questão
de fé, alguma dúvida ou pergunta foi feita? Isso nunca foi feito, pois isso
seria duvidar da própria fé, quando declarada e discutida. Mas isso foi feito após o julgamento do papa Celestino. Nem Cirilo
nem ninguém pensou em qualquer outra coisa: que, portanto, não foi um julgamento final e irreversível. (Fonte)
Ele ainda
traz informações que fulminam totalmente o argumento católico. Ele menciona as
palavras do imperador que era de fato o detentor do direito de convocar o
concílio:
O Imperador, movido por estas e outras razões, escreveu a
Cirilo: “É nossa vontade que a doutrina
sagrada seja discutida e examinada em um sínodo sagrado, que seja
ratificada e que apareça de acordo com a fé correta, quer a parte errada seja
perdoada pelos padres ou não”. Aqui vemos três coisas. Primeiro, após o julgamento de são Celestino, outro
ainda é requerido, o do concílio. Em segundo lugar, que estas duas coisas
repousariam sobre os padres: julgar
doutrina e pessoas. Em terceiro lugar, que o julgamento do concílio seria
decisivo e final. Ele acrescenta: “os que em toda parte presidem os sacerdotes
e por quem nós mesmos somos e professamos a verdade, devem ser juízes deste assunto”. Veja em quem a fé repousa. Veja em
cujo julgamento está a autoridade final
e irreversível (...) o Imperador havia expressamente decretado que “antes da sentença comum e da reunião do
santíssimo concílio, nenhuma mudança deveria ser feita em qualquer assunto,
debaixo de qualquer autoridade pessoal”. Corretamente, e em ordem, pois isso foi exigido pela majestade de um
concílio universal. Portanto, tanto Cirilo obedeceu como os bispos
descansaram. E foi estabelecido que, embora a sentença do pontífice romano em
questões de fé e sobre pessoas julgadas por violação da fé tivesse sido
promulgada, tudo estava suspenso,
enquanto a autoridade do concílio universal era aguardada. (Fonte)
Importa
destacar que o concílio inicialmente se referiu a Nestório como “reverendo”,
quando o prazo de retratação (10 dias) dado pelo bispo de Roma já havia vencido
há muito tempo. A implicação é que o concílio não considerava Nestório
excomungado, portanto, a decisão de Roma só seria efetivada após o carimbo do
concílio. O apologista Ybarra alega que Cirilo considerou Nestório excomungado
antes do concílio. Este raciocínio
falha ao não considerar que Cirilo era inimigo mortal de Nestório e considerava
a cristologia nestoriana herética em essência. Ainda assim, a premissa é falsa,
pois Cirilo escreveu uma carta à Nestório, após a decisão de Celestino e o
prazo de 10 dias, onde fica evidente que ele ainda não o considerava
excomungado (aqui). Vejam como ele inicia a carta:
Ao mais
reverendo e amante de Deus, Nestório, Cirilo e o Sínodo reuniram-se em Alexandria, na Província
Egípcia, Saudando no Senhor.
Notem que
mesmo após o sínodo de Roma, outro sínodo foi realizado em Alexandria. Ao pedir
que Nestório renuncie sua doutrina, Cirilo não apela somente ao sínodo romano,
mas ao testemunho da Escritura, dos pais da igreja e ao concílio de Niceia. Na
verdade, a incompatibilidade da doutrina nestoriana com o concílio de Niceia é
o argumento principal. Niceia já era considerado há muito um concílio ecumênico
e sua cristologia o critério da ortodoxia:
Mas não seria suficiente para sua reverência confessar
conosco apenas o símbolo da fé exposta há algum tempo pelo Espírito Santo no
grande e santo Sínodo convocado em Niceia. Afinal, você não a tem sustentado e interpretado corretamente, mas
perversamente, mesmo que você confesse com a sua voz a forma das palavras.
Cirilo afirma
o que Nestório deveria fazer:
Mas, além disso, por escrito e por juramento, você deve
confessar que também anatematiza os dogmas poluídos e profanos de vocês, e que
irá manter e ensinar aquilo que todos
nós, bispos, mestres e líderes do povo, tanto no leste quanto no oeste,
sustentamos. O santo sínodo de Roma e todos nós concordamos com a epístola
escrita à sua Santidade da Igreja de Alexandria, como sendo correta e inocente.
Nós adicionamos a estas nossas próprias cartas e aquilo que é necessário que
você mantenha e ensine, e o que você deve ter o cuidado de evitar. Agora, esta é a Fé da Igreja Católica e
Apostólica, à qual todos os Bispos Ortodoxos, tanto do Oriente como do Ocidente,
concordam.
Notem como
Roma não era colocada como uma autoridade final. Cirilo apela também ao
consenso da Igreja, tanto do leste como oeste. O sínodo Romano é citado, mas o
sínodo alexandrino também. Na sessão 3 (aqui),
Cirilo
falou:
As profissões que foram feitas por Arcádio e Projecto, os
bispos mais santos e piedosos, assim como por Filipe, o mais religioso
presbítero da Igreja Romana, manifestam-se ao santo Sínodo. Pois eles fizeram a
sua profissão no lugar da Sé Apostólica, e
de todo o santo sínodo dos bispos amados e santos do Ocidente. Por isso,
que as coisas que foram definidas pelo mais sagrado Celestino, o bispo amado
por Deus, sejam efetivadas, e que o
voto lançado contra Nestório, o herético, pelo santo Sínodo, que se reuniu na
metrópole de Éfeso, seja aceito
universalmente.
É
interessante que este trecho seja usado em favor do papado. No entanto, Cirilo
está dizendo que a decisão do bispo de Roma foi efetivada pelo Concílio e
implica que, apenas após a decisão conciliar, seria de aceitação universal.
Como o papa poderia estar acima do concílio se sua decisão necessitou ser
efetivada por ele? Nota-se que Cirilo considerava os legados papais não apenas
representantes de Roma, mas de todo o ocidente. Ainda assim, como já demonstrado,
mesmo no Ocidente, Roma não havia imposto a primazia jurídica a todas as Igrejas. O bispo primaz de Cartago não pôde estar presente no Concílio,
mas encaminhou uma carta desculpando-se pela ausência e instou a assembleia a
não permitir qualquer inovação na fé. Em toda a carta, não há qualquer menção
ao sínodo de Roma (McGuckin, p. 87). O bispo africano não diz que o concílio
deveria necessariamente seguir Roma, o que seria a postura natural de um sede
ocidental caso o papado estivesse estabelecido no Ocidente.
Outra
afirmação sem sentido é que o concílio apenas reproduziu a decisão anterior de
Roma. Na verdade, bastar dar uma verificada nos cânones do concílio para
perceber que as decisões foram muito além da excomunhão de Nestório (aqui). Os atos em que os legados papais exaltam a autoridade de Roma
estão na sessão II, mas a fase deliberativa do concílio ocorreu na sessão I. Os
extratos desta sessão deixam claro que os bispos reunidos não estavam apenas
reproduzindo a decisão de Celestino:
E depois que a carta foi lida, Cirilo, o bispo de Alexandria,
disse: Este santo e grande Sínodo ouviu o que escrevi ao mais religioso Nestório, defendendo
a fé correta. Eu penso que em nenhum aspecto me afastei da verdadeira
declaração da fé, isto é, do credo
estabelecido pelo santo e grande sínodo anteriormente reunido em Niceia.
Por isso desejo a vossa santidade [isto é, o Concílio] para dizer se com razão e sem culpa e de acordo com o santo sínodo eu
escrevi estas coisas ou não. (Sessão I,Concílio de Éfeso)
McGuckin escreveu:
(...) o Credo de Niceia foi lido a pedido de Juvenal de Jerusalém, como o padrão de ortodoxia a ser seguido
nas subsequentes adjudicações. (McGuckin, p. 82)
Cirilo submete a carta que
havia escrito a Nestório à deliberação do concílio. Lembremos que a ortodoxia
da carta já havia sido aceita e afirmada por Celestino. O mais importante é que
o critério de ortodoxia pela qual Cirilo seria julgado era o credo niceno e não
a carta de Celestino. Se esta não é a clara evidência da supremacia do concílio
sobre o bispo de Roma, o que mais poderia ser?
Ainda na sessão I:
Paladio,
o bispo de Amasea, disse: A próxima coisa a ser feita é ler a carta do mais
reverendo Nestório, da qual o mais religioso presbítero Pedro fez menção; para que possamos entender se concorda ou
não com a exposição dos pais de Niceia (...)
E
depois que esta carta foi lida, Cirilo, o bispo de Alexandria, disse: O que
parece bom para este sínodo sagrado e grande em relação à carta que acabamos de
ler? Parece também consonante com a fé
estabelecida pelo Santo Sínodo reunido na cidade de Niceia?[Os
bispos, então como antes, expressam
individualmente sua opinião, e finalmente os Atos continuam (col. 502)]
Após, a carta de Celestino
condenando Nestório também foi lida:
Juvenal,
o bispo de Jerusalém disse: “Leia-se a carta do mais sagrado e reverendo
Celestino, arcebispo da Igreja de Roma, que ele escreveu sobre a fé.
Os bispos conciliares então
disseram:
(...) que o Credo de Niceia e a carta
de Cirilo concordam e harmonizam em todas as coisas.
Ou seja, os
atos evidenciam que houve uma deliberação genuína, o que só é possível quando
uma decisão final ainda não fora tomada. Além do fato
de Nestório ter tido um bom número de apoiantes, McGuckin relata que havia
dúvida verdadeira a respeito das decisões a serem tomadas:
Os fatores chaves diante do imediato prelúdio do concílio
eram a delegação síria (a qual tinha uma política, como Cirilo já sabia,
desenhada para atacar sua própria teologia como expressa nos doze capítulos) e o grande número de bispos indecisos,
sessenta ou setenta no total, que não sentiam ainda nenhuma necessidade de se
comprometer com nenhum partido antes de ouvirem os argumentos de ambos os lados.
Alguns deles não tinham opinião porque não haviam completamente compreendido a
controvérsia, e outros não estavam preparados para dar a Cirilo a presidência
do concílio, dado o seu envolvimento na disputa (...) tanto o partido
de Cirilo como de Nestório se concentraram em mudar as mentes dos neutros.
(McGuckin, p. 60)
Estes bispos,
que juntamente com os sírios e os apoiantes de Nestório formavam a maioria,
sabiam das decisões do sínodo romano. Ainda assim, reservavam a si o direito de
analisar a questão e genuinamente julgá-la, não seguindo a priori qualquer
arroubo de autoridade de Roma. A questão era tão sensível que diversos casos de
violência entre os grupos foram relatados (p. 61). Um trecho também citado
pelos apologistas é o decreto de excomunhão de Nestório:
Como, além de outras coisas, o ímpio Nestório não obedeceu à
nossa convocação e não recebeu os santos bispos que foram enviados por nós a
ele, fomos compelidos a examinar suas doutrinas
ímpias. Descobrimos que ele havia
realizado e publicado doutrinas ímpias em suas cartas e tratados, bem como em
discursos que ele entregou nesta cidade, e que foram testemunhados. Compelido pelos cânones e pela carta (ἀναγκαίως
κατεπειχθέντες ἀπό τῶν κανόνων, καὶ ἐκ τὴς ἐπιστολῆς, κ.τ.λ.) do nosso mais santo pai e companheiro servo
Celestino, o bispo romano, nós viemos, com muitos lágrimas, a esta dolorosa
sentença contra ele, a saber, que o nosso Senhor Jesus Cristo, a quem ele
blasfemou, decreta pelo santo Sínodo que
Nestório seja excluído da dignidade episcopal e de toda a comunhão sacerdotal. (Decreto do Concílio Contra Nestório)
O argumento é
que como eles foram “compelidos” pela carta de Celestino, o Concílio não
poderia tomar qualquer decisão que não fosse a condenação de Nestório. Ocorre
que tal interpretação não coaduna com o conteúdo de toda a citação. Observem
que eles foram compelidos a examinar a doutrina de Nestório, uma vez que o
próprio não compareceu ao Concílio para se explicar. Ou seja, eles examinaram e
julgaram as ideias nestorianas. Além disso, a carta do sínodo romano havia sido
lida e foi objeto de deliberação pela assembleia, assim como foram as cartas de
Cirilo. Foi somente após o exame e a deliberação desses documentos que os bispos
emitiram o decreto acima. A única conclusão lógica é que eles são compelidos
pela carta de Celestino não porque ela tinha uma autoridade intrínseca para
decidir finalmente a questão, mas porque o julgamento de Roma era o correto. A
carta de Celestino ao concílio apenas reafirma as mesmas condenações já
decretadas no ano anterior (430) no sínodo romano. Os bispos estavam cientes
disso, e ainda assim reabriram e examinaram o caso. O próprio Cirilo escreveu
uma carta para Alexandria logo após o Concílio:
Nosso Salvador demonstrou seu poder defronte a todos aqueles
que blasfemaram sua glória. Nós iremos
finalizar os papéis legais necessários para sua excomunhão, e então pela
graça de Deus iremos logo estar com vocês novamente. (Carta n. 24 para Alexandria)
Fica claro
que Cirilo não considerava Nestório excomungado até as decisões do Concílio. As
decisões do sínodo romano e alexandrino foram suspensas até a decisão do
concílio universal. O sínodo envia a carta de excomunhão a Nestório:
O santo sínodo que pela graça de Deus se reuniu em Éfeso, em acordo com as instruções do nosso mais
religioso e amado de Cristo Imperador, para Nestorio, o novo Judas. Saiba
que por causa de sua perversa pregação e
desobediência aos canones, neste vigésimo segundo dia do presente mês de
Junho, e de acordo com as leis
eclesiásticas, você foi deposto pelo santo sínodo e excluído de toda
dignidade eclesiástica. (Carta de deposição para
Nestório)
Os cânones
desobedecidos foram os de Niceia. A carta não faz sequer menção a Roma. Nestório
foi julgado segundo Niceia que era um padrão de ortodoxia superior ao bispo de
Roma.
Os fatos após o Concílio e o poder do Imperador
Quem não está
familiarizado com história conciliar poderia pensar que tudo estava encerrado.
No entanto, era necessário obter a sanção do imperador. Na verdade, se alguém
poderia reclamar algum tipo de primazia, este era o imperado, como ficará
evidente a partir dos fatos a seguir. Como dito, o Concílio fora aberto antes
da chega de João de Antioquia e seus partidários. Ao chegarem em Éfeso,
Nestório já havia sido condenado. Os sírios então resolveram abrir um concílio
paralelo que, por sua vez, condenou a cristologia de Cirilo e o excomungou.
Dessa forma, havia dois concílios com decisões distintas. A quem eles recorreram
para validar suas decisões? Ao bispo de Roma? Obviamente não. Ambos apelaram ao
imperador para sancionar suas decisões:
(...) Em 29 de junho, o
Imperador enviou um magistrado examinador, Paladio, para Éfeso com a
comissão de descobrir o que exatamente estava acontecendo, e para auxiliar Candidiano
[o representante do imperador no Concílio] a manter a ordem. O imperador
ordenou que todos os bispos permanecessem em Éfeso até que a investigação estivesse completa. O tom de sua carta era
de clara irritação, e ele os censurou por não obedecerem suas ordens. Até que uma discussão livre fosse
realizada, os resultados do concílio de Cirilo estavam suspensos. (McGuckin, p. 97)
O imperador
havia tomado conhecimento de que o Concílio fora iniciado sem a presença dos
Sírios a partir de uma carta de Nestório e outra de Candidiano. Após os
resultados deste primeiro exame, o imperador toma uma decisão surpreendente: os
dois concílios foram sancionados. O resultado era que tanto Nestório quanto
Cirilo e Memmon (bispo de Éfeso) foram depostos e presos (p. 98).
Após tal decisão, novos apelos foram levados ao imperador de todos os lados. O
imperador decide então ouvir pessoalmente comissões de ambos os lados em
Calcedônia. Esteve evento ficou conhecido como Colóquio de Calcedônia (p. 104). Nenhum dos lados era capaz de demover o outro, de forma que um acordo
não foi possível. McGuckin relata o resultado final:
A política de Teodósio estava finalmente para ser publicada
neste período. Ele veio em favor da maioria de Éfeso. A deposição de Nestório deveria ser final, e a acusação de
apolinarismo contra Cirilo foi desconsiderada. Por outro lado, ele determinou que os antioquenos deveriam
também ser aceitos como ortodoxos em sua doutrina. (p. 106)
No fim das
contas, foi a decisão do imperador que efetivou em última instância a deposição
de Nestório. A palavra final foi dele e não do bispo de Roma. A este sistema,
em que o imperador exercia significativo poder sobre as questões da Igreja,
dá-se o nome de cesaropapismo.
Os Concílios de Éfeso e Niceia: os limites da jurisdição de
Roma
O cânon 8 de
Éfeso é de especial interesse, pois ecoa um antigo costume da Igreja:
Nosso irmão bispo Regino, o amado de Deus, e seus
companheiros bispos de Deus, Zeno e Evagrio, da Província de Chipre, nos
relataram uma inovação que foi introduzida contrária às Constituições eclesiásticas e aos Cânones dos Santos Apóstolos, e
que afeta a liberdades de todos. Portanto, uma vez que os danos que afetam a
todos requerem mais atenção, pois causam danos maiores e, particularmente, quando são transgressões de um costume
antigo; e desde aqueles excelentes homens, que pediram ao Sínodo, nos
disseram por escrito e por palavra que o
bispo de Antioquia realizou ordenações no Chipre. Portanto, os Governantes
das igrejas sagradas de Chipre gozarão, sem disputa ou dano, de acordo com os Cânones dos santos Pais e
costumes antigos, o direito de realizar para si mesmos a ordenação de seus
excelentes Bispos. A mesma regra deve ser observada
nas outras dioceses e províncias em todos os lugares, de modo que nenhum
dos bispos amados por Deus assuma o
controle de qualquer província que não tenha, desde o início, estado sob sua
própria mão ou de seus predecessores. Mas se alguém violentamente tomou e
sujeitou [uma Província], ele deve desistir; para que os Cânones dos Pais não
sejam transgredidos; ou as vaidades da honra mundana sejam trazidas sob
pretexto de ofício sagrado; ou percamos, sem saber, pouco a pouco, a liberdade
que Nosso Senhor Jesus Cristo, o Libertador de todos os homens, nos deu pelo
seu próprio Sangue. (Cânon VIII)
O bispo de
Antioquia havia realizado ordenações na província do Chipre, o que era
contrário às constituições eclesiásticas, aos cânones dos santos apóstolos, dos
santos Pais e ao costume antigo. A regra em questão era que nenhum bispo
assumisse o controle de uma província que não havia segundo o costume
tradicional estado debaixo de sua jurisdição. Como a província do Chipre não
estava debaixo do controle do patriarcado de Antioquia, as ordenações eram
inválidas. O que se está afirmando é a independência eclesiástica das igrejas,
que por óbvio, também obrigava a Igreja de Roma. Os romanos não poderiam
ordenar sacerdotes em outras sedes, o que evidencia os limites de sua
jurisdição. Mas o que seriam os documentos citados? O antigo epítome deste
cânon trazia a seguinte redação:
Que os direitos de cada
província sejam preservados puros e invioláveis. Nenhuma tentativa de
introduzir qualquer forma contrária a estes será de qualquer utilidade.
Schaff, ao
comentar este cânon, cita com aprovação o argumento de Beveridge:
Beveridge é de opinião que esta é uma leitura mais
verdadeira, pois, embora sem dúvida os Padres Efésios tivessem em mente os
Cânones Apostólicos, ainda assim parecem
ter se referido mais particularmente neste lugar aos cânones de Niceia. E
isto parece estar declarado no libelo dos Bispos de Chipre, que deram origem a
este mesmo decreto, no qual se diz que a prática condenada é “contrária aos cânones
apostólicos e às definições do santíssimo
Concílio de Niceia."
O Concílio de
Éfeso está reverberando Niceia que apresenta vários cânones a respeito da
independência eclesiástica das Igrejas. De especial interesse é o cânon 6, que,
como já visto, instituiu e delimitou as áreas de influência dos patriarcados:
O bispo de Alexandria terá jurisdição sobre o Egito, Líbia e
Pentápolis; assim como o bispo Romano
sobre o que está sujeito a Roma. Assim, também, o bispo de Antioquia e os
outros, sobre o que está sob sua jurisdição. Se alguém foi feito bispo
contrariamente ao juízo do Metropolita, não se torne bispo. No caso de ser de
acordo com os cânones e com o sufrágio da maioria, se três são contra, a
objeção deles não terá força. (Cânon VI deNiceia)
Éfeso e a condenação ao pelagianismo
O concílio
também condenou o pelagianismo:
Quando havia sido lido no santo Sínodo o que havia sido feito
tocante ao depoimento dos pelagianos e celestinos mais irreligiosos, de
Célestio, Pelágio, Juliano, Présidio, Florus, Marcelino e Orôncio, e os
inclinados a gostar dos erros, nós
também julgamos correto (ἐδικαιώσαμεν) que as determinações de sua santidade
concernentes a elas permaneçam fortes e firmes. E todos nós éramos da mesma
mente, mantendo-os depostos.
Este trecho
da carta é relevante. Os pelagianos e celestinos já haviam sido julgados pelo
bispo de Roma. Eles foram considerados hereges e depostos de seus cargos.
Todavia, o concílio julga essas decisões como corretas e as mantém. Novamente,
se a decisão de Roma era final, porque o concílio se manifestaria? O papa Zósimo,
depois de apoiar Pelágio, voltara atrás e confirmaria a condenação de seu
predecessor Inocêncio. Lembremos também que Nestório enviou cartas a Celestino, onde deixava claro que poderia reabrir o caso dos pelagianos. Por isso, a seguinte afirmação de Ybarra é falsa:
Bem, ele pode ter sabido da controvérsia pelagiana
que recebeu um julgamento final do
papa Santo Inocêncio I.
O julgamento
de Inocêncio foi revisto Zósimo e ainda precisou
ser ratificado por Éfeso.
A questão de João de Antioquia
O apologista
católico, ao responder meu artigo sobre Agostinho e o papado, afirmou o
seguinte:
Ainda
há o julgamento de Nestório e de um bispo de Antioquia de nome João no Concílio
de Éfeso, onde fica a cargo da Sé Apostólica (neste caso o Papa da época). Fica um pergunta aos detratores da Primazia
de Roma: por que um considerado herege oriental, segundo aqueles que advogam
que o conciliarismo era a instância superior, deixou-se para ser julgado por
Roma?
Primeiro,
quando ele diz “um bispo de Antioquia”, já deixa claro que não conhece o
assunto em questão. João era o patriarca de Antioquia e não apenas um bispo.
Assim que o concílio foi encerrado, Cirilo escreveu uma carta sinodal ao papa
Celestino relatando os acontecimentos (aqui). Portanto, esta carta é anterior aos eventos que se seguiram
ao concílio, nos quais o imperador teve que examinar a questão e o colóquio de
Calcedônia ocorreu. Vejamos o trecho:
Sendo
justamente contrariado, portanto, nós determinamos infligir de acordo com a lei
a mesma penalidade sobre ele e aqueles que estavam com ele, o que ele
contrariamente à lei havia pronunciado contra aqueles que tinham sido
condenados sem nenhuma culpa. Porém, embora de maneira mais justa e de acordo
com a lei, ele sofreria esse castigo ainda na esperança de que, pela nossa
paciência, sua temeridade pudesse ser dominada, reservamos isso à decisão de sua santidade. Enquanto isso, nós os privamos da comunhão e retiramos
deles todo o poder sacerdotal, para que eles não sejam capazes de fazer mal
algum por suas opiniões.
João havia acusado Cirilo e
outros membros do concílio de serem hereges apolinaristas. No entanto, o
Concílio em nenhum de seus cânones declara João como herege, pois de fato não
era claro se ele endossava a doutrina de Nestório. Esta decisão teria sido reservada
ao bispo romano. De qualquer forma, João e seus partidários foram depostos de
seus cargos e privados da comunhão, mas não excomungados. Porque o concílio não
excomungou João de Antioquia? Ocorre que o concílio universal era regulado por leis
canônicas e acima de tudo pela convocação do imperador que delimitava o objeto
a ser examinado. Além disso, apesar de os sírios terem sido contrários a
deposição de Nestório, eles de fato nunca endossaram a cristologia nestoriana. Qualquer decisão do concílio de excomungar João não era canonicamente válida.
Eis a razão porque Cirilo
atribuiu esta tarefa ao bispo Romano. O que ocorreria caso Celestino decidisse
pela excomunhão de João de Antioquia? O mesmo que ocorrera com Nestório. As
decisões de Roma não eram de assentimento obrigatório pelo Oriente. No mínimo,
um sínodo Oriental teria que endossar a decisão de Roma e, com o apoio do
imperador, se tornaria efetiva.Tenhamos também em vista que o imperador foi quem deu a
decisão final no Colóquio de Calcedônia, em que ficou decretado que os sírios
deveriam ser considerados ortodoxos. Esta foi provavelmente a razão pela qual
nem Celestino nem seu sucessor (Sisto III) tomaram qualquer decisão formal
contra João. Eles não poderiam, pois a decisão do imperador os impedia. Após tudo isso, o patriarcado de Antioquia e os de Alexandria e Roma
romperam a comunhão, pois os sírios continuaram a não considerar Cirilo
ortodoxo e a atacar a deposição de Nestório. Eles só retornariam a comunhão por
iniciativa de Teodósio:
No
meio do ano de 432, Teodósio decidiu aplicar a cura para a divisão dos bispos
sírios, e consultou Maximiano e seu
sínodo local em Constantinopla para a melhor forma de proceder. Logo após,
ele escreveu para João de Antioquia deplorando a continuidade das inimizades e
estabelecendo os termos do seu plano de reconciliação que foi desenhado pelo
sínodo de Constantinopla sob a influência do bispo Proclos que teve grande influência
nisto. Foi requerido dos Sírios o reconhecimento da deposição de Nestório e a
condenação de seu ensino como herético, e
assim, o papa Celestino, Cirilo e todos os outros bispos iriam recebe-los na
comunhão. (McGuckin, p. 110)
Destaca-se que a iniciativa do
imperador partiu de um pedido de Celestino, que escrevera uma carta a ele pouco antes de falecer (p. 110, nota de rodapé n. 185). Note-se que os termos
da comunhão, no documento que ficou conhecido como Fórmula de Reunião, foram
definidos pelo sínodo de Constantinopla e não por Roma. Isto se deu porque este
patriarcado readquirira seus antigos direitos de atuar como corte de apelação
final no Oriente. Inicialmente, os sírios não aceitaram os termos da fórmula.
Somente após muitas negociações, a Fórmula de Reunião foi aceita por todos e
foi adotada pela corte imperial como teste de ortodoxia para toda a Igreja
oriental em 433 (p. 117)
Conclusão
Todo o
contexto histórico do Concílio de Éfeso só reforça a posição padrão da
historiografia sobre o papado – o bispo Romano não exerceu primado
jurídico sobre o Oriente. O argumento principal de que o decreto do papa
Celestino não se tornou efetivo até a decisão do concílio
geral de Éfeso se mantém. As decisões do concílio eram superiores
as de Roma. Caso Roma detivesse a palavra final, o Concílio de Éfeso nunca
teria ocorrido.
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